Esperemos atentamente e engajemo-nos lucidamente!
Quando Jesus pede que
fiquemos vigiando, “pois não sabeis qual será o dia, nem a hora”, estaria se
referindo a tragédias como as que recentemente ocorreram em Mariana e
Brumadinho? Seguramente, não! Nestes casos, a vigilância responsável cabia aos
empresários e administradores, e, em nome da sociedade, aos órgãos
fiscalizadores do estado e do país. Jesus não pede que “fiquemos e olho” ou
“com as barbas de molho” porque algo terrível está sendo preparado por Deus e
vai acontecer. Isso não faz parte dos planos dele!
Jesus está falando
sobre o mistério e o dinamismo do reino de Deus, que traz tudo de bom para todos,
e passa longe das pregações de mau gosto e interesse suspeito que se tornaram
comuns na boca de pastores e padres de ocasião. Jesus insiste na necessidade de
preparar-nos adequadamente para esse acontecimento, pois ele se manifesta
discretamente, cresce como a semente escondida na terra, mas um dia deve aparecer
em toda a sua beleza e esplendor. A manifestação do reino de Deus é algo que não
devemos temer mas desejar, porque é benéfico para a humanidade toda, e
preparar, porque sua edificação depende de nós!
É claro que isso não
tem nada a ver com o propalado e temido fim do mundo, ao menos do mundo em
sentido físico. A irrupção do reino de Deus significa o fim de um mundo, deste mundo de competição
predatória, de dominação violenta, de exploração desmedida, de indiferença
globalizada, de soberba inflacionada, de desigualdade absurda. Trata-se do fim
deste “mundo imundo” e da manifestação de um novo modo de viver e conviver, de
trabalhar e consumir, de crer e de celebrar, de fazer alianças e de lutar. E o
fim deste mundo nos encanta e estimula, como a chegada do noivo, com o que se
inicia a festa que não tem limites nem fim.
Para guiar-nos nessa
esperança que faz caminhar, Jesus conta a parábola das dez moças que saíram ao
encontro do noivo que devia chegar para que a festa começasse. Cinco jovens,
desavisadas e desatentas, pouco lúcidas e muito afoitas, pegaram lâmpadas mas
não se preocuparam com uma reserva de óleo; pensavam que a espera era coisa de
pouco tempo. As outras cinco, entusiasmadas, mas mais previdentes, levaram uma
reserva de óleo, prevendo a possibilidade de que a espera fossem mais longa do
que gostariam.
E foi exatamente isso
que aconteceu! A vinda do noivo demorou mais que o previsto, e as lâmpadas do
grupo mais afoito se apagaram. Enquanto foram improvisar uma solução, o noivo
chegou, as outras moças o acolheram e foram recebidas na festa. E as portas se
fecharam. Com as lâmpadas tardiamente reabastecidas e acesas, o segundo
quinteto bateu com insistência, mas sem sucesso. O noivo disse que não as reconhecia,
pois quem quer ser sua amiga deve viver vigilante e engajada. Assim, o/a
discípulo/a de Jesus!
A atitude de
vigilância recebe destaque na liturgia, na medida em que estamos nos aproximando
do fim do ano litúrgico. E isso possibilita que pensemos também no fim do mundo
e no fim da vida. Mas nisso a gente não gosta muito de pensar. Pensemos então
num fim de campeonato de futebol: como a rodada final é esperada, preparada,
encarada com seriedade. Haja treinamento! A diferença é que o final de um
campeonato tem uma data prevista, mas a expectativa, a preparação, a ansiedade,
são semelhantes ao que se espera em relação à irrupção do reino de Deus, que
não tem data marcada.
No Brasil, vivemos
tempos sombrios, temerosos, devastadores como os “acidentes” de Mariana e
Brumadinho, a pandemia, o desmonte das políticas, organizações e instituições
sociais e ambientais. Um Executivo golpista e impopular, secundado por um
Congresso que não representa a nação, caça um por um direitos sociais e
ambientais que custaram anos de luta, suor e sangue. Com a criminosa conivência
da grande imprensa, vende o patrimônio coletivo e achincalha a democracia. Não
podemos esperar que isso se acabe por decurso de prazo. Precisamos imitar as
jovens prudentes, munir-nos do óleo da indignação e partir para a luta. Neste
sentido, “esperar não é saber”, e “quem sabe, faz a hora, não espera
acontecer...”
Deus Pai e Mãe, Compaixão e Misericórdia, Sabedoria
dos humildes, Força dos fracos: teu filho nos pede vigilância e engajamento,
para que não fiquemos fora da festa da Vida. Que a tua Sabedoria venha ao nosso
encontro, acorde-nos do sono letárgico e desperte-nos para a profecia. Que
nossos pensamentos, noturnos e diurnos, sejam o teu Reino. Que nas vigílias
suspiremos por ele. Que seja por ele o cântico que brota dos nossos lábios. E
que os eventos que celebramos nos próximos domingos – dia dos pobres e dia dos
leigos – provoquem em nossas comunidades atitudes e iniciativas que deem novo
rosto à Igreja. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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