quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

ANO C – TEMPO DO NATAL – SOLENIDADE DE MARIA, MÃE DE DEUS – 01.01.2016

A Paz só será possível mediante a superação da indiferença!

Na celebração cristã do novo ano entreleçam-se três comemorações: o início de um novo ano civil, a festa da maternidade de Maria e a jornada mundial pela Paz. Para começar, não esqueçamos que um ano novo, marcado pela novidade regeneradora da Paz, não costuma chegar da noite para o dia, ao ritmo de fogos de artifício. As novidades promissoras e duradouras são gestadas muito pacientemente no ventre profundo da história e das pessoas de boa vontade, daquelas que acolhem os dons e convites que vêm dos desertos, das periferias e das fronteiras, dons que desestabilizam e põem a caminho.
Iniciamos o novo ano no clima espiritual do Natal. A liturgia continua convidando-nos a penetrar mais profundamente o mistério da encarnação de Deus. Hoje, contemplamos a chegada dos pastores à gruta ou estábulo de Belém. Ali eles encontram Jesus no seio de uma família pobre e migrante. Ficam vivamente impressionados com o que vêem, e comparam com tudo aquilo que tinham ouvido. É possível imaginar a pergunta que ressoa na cabeça deles: Como pode uma criatura tão frágil ser portadora da Paz a todos os homens e mulheres de boa vontade?
Nascido e acolhido também por nós e no meio de nós, Jesus de Nazaré pode pacificar o mundo estabelecendo relações novas, baseadas na justiça e no combate à indiferença. E ele cumpre a promessa de Deus e a esperança humana através de cada um de nós, de homens e mulheres de boa vontade, de líderes autênticos e de organizações que não se resignam à paz aparente,  à paz que se edifica e sustenta sobre a indiferença e o equilíbrio de forças ou o terrorismo, seja aquele promovido pelos grupos radicais ou aquele sustentato pelos Estados prepotentes.
Parece que os pastores conseguiram compreender o mistério de um Deus que não se compraz na força dos cavalos ou dos tanques, nos cortejos de acólitos, nas doutrinas e nos códigos de direito, nem tampouco nos kamikazes ou homens-bomba. Deus se alegra com o despojamento voluntário e solidário de quem se faz próximo e peregrino com os deslocados e, por isso, vive louvando e glorificando a Deus por tudo o que vê e ouve. O próprio nome de Jesus é boa notícia da salvação: Deus salva seu povo do pecado. Ele age libertando, perdoando, e isso é motivo de profunda e agradecida alegria.
Em Jesus de Nazaré, na encarnação, missão e paixão do Filho de Deus, somos libertados do débito que temos conosco mesmos e com os outros por não conseguirmos realizar a utopia que realmente sonhamos. Estamos livres da culpa de termos ficado aquém ou errado o alvo. Deus não espera que cheguemos heroicamente a esta meta. Ele mesmo vem decididamente ao nosso encontro e, tomando-nos pela mão, nos conduz e sustenta nesse caminho. Ele é nossa Paz! Paz entre pessoas, religiões, classes, nações, partidos. Paz entre vencidos e vitoriosos. Paz também entre a humanidade e a criação.
Suspiramos por esta Paz que é t­ão necessária quanto urgente. Uma paz que não venha apaziguar superficialmente as relações humanas, passando à margem das relações desiguais que precisam ser mudadas. Gememos e sofremos por uma Paz geral, concreta e profunda, que parece atrasada e até impossível. Lutamos por esta Paz em todas as frentes, a ponto de quase perdermos a paz. Sem esquecer que, na sua mensagem para a Jornada Mundial pela Paz, celebrada universalmente no dia de hoje, o Papa Francisco  pede que construamos a Paz vencendo a indiferença.
É do ventre da dor humana assumida solidariamente que o Espírito desperta a dignidade de todas as criaturas e o grito em coro: “Abbá, pai querido!” Nascido de mulher e sob a Lei, Jesus conduz à liberdade todas as pessoas, começando pelos últimos, pelas pessoas que são colocadas à margem. Ele confirma que  Deus reconhece todos como filhos, e nos convida a superar relações pautadas pelo medo e pela dominação. Como filhos, somos também herdeiros do Reino de Deus, da “shalom” que proporciona o “tudo de bom” que repetimos nestes dias de passagem, o convívio sadio que tem sua base na compaixão que vence a indiferença e na justiça que destrói a desigualdade.
Deus querido, Pai e Mãe! Neste ano que se inicia, faz com que sejamos construtores de Paz. Ensina-nos a contemplar e compreender o anseio de Paz e de comunhão que pulsa no coração do mundo, e a superar a indiferença que tende a se propagar como se fosse sabedoria e boa notícia. Suscita em nós o canto que brota da dignidade de filhos e filhas que teu Filho concedeu. Faz de nós e das nossas comunidades incansáveis construtores da Paz. E dá-nos experimentar, como o concedeste a Maria e aos pastores, a alegria de reconhecer a grandeza de Deus na pequenez e na fragilidade humana. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro dos Números 6,22-27 * Salmo 66 (67) * Carta aos Gálatas 4,4-7 * Lucas 2,16-21)

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