Converter-se
a uma fraternidade sem fronteiras.
A realidade política,
social e cultural que vivemos hoje no Brasil é muito semelhante àquela que
Jesus evidencia no evangelho: são dois filhos do mesmo pai, mas o filho mais
velho reclama seus méritos, acusa quem vive na miséria e não o reconhece como
seu irmão. Há quem tenha até batido panelas cheias e protestado contra a
inclusão de gente historicamente excluída. Mas Jesus age como uma espécie de
transgressor, beneficiando pessoas que não pertencem ao judaísmo (7,1-10;
10,25-37), acolhendo outras de má fama (5,27-32; 7,36-50), convivendo com
pessoas indesejadas e ajudando aquelas que são consideradas impuras (4,38-39;
5,1-16; 7,11-17; 8,26-56).
O filho mais jovem da
parábola representa exatamente estes marginalizados e excluídos, menosprezados
e perseguidos pelo mais alto mandatário do nosso país. Uma leitura apressada e
moralista da parábola põe a atenção na controversa atitude do filho mais jovem:
pedir a parte da herança à qual tem direito; esbanjar tudo imprudentemente;
arrepender-se e voltar à casa do pai. Porém, o mais importante na parábola é a
alusão à situação em que vivem aqueles com quem Jesus se solidariza: são como
desempregados num país estranho; mendigam para sobreviver; são tratados pior
que cães e os porcos.
Com esta parábola, Jesus chama
a atenção para a figura do pai, símbolo da ação de Deus. Sua bondade supera uma
justiça que se restringe a dar a cada um aquilo que, segundo a lei ou os
costumes, lhe corresponde e, ‘tomado de compaixão’, corre ao encontro do filho
necessitado, abraça-o, veste-o e beija-o. O pai não se importa com a confissão
daquele que não é mais reconhecido como gente, tanto que sequer permite que a
finalize. Para o pai misericordioso, aquele resto humano nunca deixou de ser
seu filho, e isso é o mais importante, o que realmente importa.
Deus não trata ninguém como
empregado, muito menos como estrangeiro ou devedor. Ele não é contador, nem
juiz! Todos são filhos e filhas, e podem usufruir incondicionalmente da sua
acolhida e dos seus bens. Na sua casa há lugar para todos! Para os filhos e
filhas maltratados e mais necessitados ele reserva as melhores túnicas, o anel
com o brasão da família e a festa com carne do novilho mais gordo. No seu
projeto, ninguém é excluído nem padece fome. No plano do Pai, as políticas
sociais em favor dos pobres e vulneráveis ocupam o primeiro lugar! E isso mesmo
que seja verdade que o fim da miséria seja apenas o começo.
Mas, infelizmente, existem
cristãos que, por ignorância ou por maldade, murmuram contra a proposta de um
mundo diferente e acusam os que ousam ensaiá-lo. Representando os fariseus e
escribas, o filho mais velho é o protótipo do cidadão e do crente
preconceituoso e observante. Não lhe falta nada, e tem tudo em abundância, mas
não esconde que, frente a Deus, se sente credor e cheio de méritos, melhor que
todos os demais. Não consegue disfarçar sua raiva diante de um pai que acolhe
generosamente o jovem inquieto e necessitado de tudo. Ofende o próprio pai,
acusando-o violentamente de ser parcial, avarento e injusto ao decidir acolher
o filho em situação de miséria.
O filho mais velho não
reconhece aquela criatura miserável e necessitada como sendo seu irmão.
Discutindo com o pai, refere-se a ele como ‘esse teu filho’. Mas o pai, depois
de afirmar que os bens que o avarento filho julga serem seus na verdade lhe
foram doados, insiste que aquele não-cidadão acolhido com festa é ‘teu irmão’.
A solidariedade faz da humanidade uma família onde todas as pessoas se
reconhecem e protegem mutuamente, e a ação contra a exclusão está intimamente
associada à criação e recomposição dos laços sociais, laços de humanidade, ao
nascimento como nova criatura, que desconhece a cínica fronteira entre “homens
de bem” e “os outros”.
Jesus de Nazaré,
peregrino no santuário das dores e esperanças humanas: desejamos ardentemente
sentar à mesa do teu Reino, entre os pobres resgatados e os fiéis agraciados.
Livra o nosso país do descaso com a pandemia e com os pobres, da violência
social, do opróbrio da discriminação e da necessidade de mendigar direitos
humanos. Infunde em nós a generosidade daquele pai com um coração de mãe, para
que saiamos ao encontro dos oprimidos e os acolhamos festivamente,
compartilhando com eles a palavra, a mesa e a missão. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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