É
possível decifrar os sinais emitidos pelo Leão?
Tendo
passado pouco mais de um dia desde o anúncio de habemus papam preanunciado pela mais famosa chaminé da face da
terra, hipóteses, teses, intuições e informações garimpadas e agrupadas por jornalistas
e vaticanólogos já enchem jornais,
revistas e mídias sociais. Quanto maior é o silêncio do próprio Leão (até
ontem, Roberto Francisco), mais cresce a curiosidade e se avolumam as opiniões
e divagações. Mesmo sem fontes e fundamentos sólidos, permito-me fazer coro aos
palpiteiros do momento.
Para
os curiosos e os amigos dados ao misticismo, lembro que figuras de leões são
comuns na arte e na decoração do mundo antigo: figuras de leões estão presentes
no trono de Salomão e na decoração do templo que ele construiu em Jerusalém; os
querubins vistos pelo profeta Ezequiel tinham cara de leão; seu rugido era
temido na Palestina antiga, pois agredia os rebanhos e podia atacar o ser
humano. Será que o povo católico deve temer o nosso novo Papa?
No
primeiro testamento, o leão aparece geralmente como metáfora de inimigo, mas
rainhas e princesas, e tribos e povos também são comparados a leões por sua
audácia, força e ferocidade. Era visto como “filho do orgulho”, como hoje o
vemos como “rei dos animais”. O próprio Deus é comparado a um leão que ruge
contra Israel ou contra seus inimigos (cf. Os 5,14; Is 31,4). Num texto poético
e utópico, Isaías imagina a reconciliação e a convivência do leão com os animais
que ele persegue e mata (cf. Is 11,6; 65,25).
Mas
isso não passa de digressão humorada para distrair quem costuma ser muito sério
e concentrado, e nada desvenda das características que o Papa Leão XIV pensa
dar ao seu ministério de guiar a Igreja na caridade. O que parece bastante
seguro é que o Cardeal Robert Francis encontra inspiração no grande Papa Leão
XIII (1878-1903). Num tempo marcado por tensões sociais e revoluções
tecnológicas Leão XIII construiu pontes de diálogo e colaboração com a classe
operária, afirmando corajosamente alguns direitos e inaugurando o pensamento
social cristão. E isso é muito auspicioso.
Também
precisamos levar em conta que o Frei Robert Francis foi missionário no Peru,
decidiu pela cidadania peruana, foi nomeado bispo e atuou como bispo nesse país
latino-americano, berço da teologia da libertação. Na verdade, ele é mais latino-americano
que norte-americano! É significativo que ele tenha falado sobre isso na sua
primeira manifestação como Papa, e tenha mencionado também seu sonho de uma
Igreja que dialogue, que seja missionária, que ilumine, que construa pontes.
Seria um sinal que aponta para uma promissora estação missionária, uma resposta
tardia ao apelo de Leão XIII, na sua Encíclica Sancta Dei Civitas (03.12.1880)?
Ser
descendente de migrantes, crescer numa cidade industrial e operária (Chicago), ser
missionário e pastor no Sul do mundo e ser nomeado Bispo e Cardeal pelo Papa
Francisco, parecem ser sinais eloquentes que apontam para uma etapa de
continuidade criativa das sendas abertas pelo já saudoso Francisco. Mais que um
“filho do orgulho” ou um “rei poderoso dos animais”, ele poderá ser semelhante
ao Frei Leão, um dos companheiros e amigos mais queridos de Francisco, o Irmão pobre
e sonhador de Assis.
Itacir Brassiani msf
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