A nova visão de Igreja e de
Missão do Concilio Vaticano II
Na manhã de hoje, fui chamado a dar minha contribuição
pessoal no Curso de Aperfeiçoamento da Ação
Missionaria que estamos desenvolvendo em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia. Foi-me solicitado que desenvolvesse o tema do
Carisma missionário dos Missionários da Sagrada Família. Inicialmente, resgatei
alguns textos referenciais para a compreensão da intenção do Fundador e
apresentei como este Carisma foi se desenvolvendo na história da Congregação. Em
seguida, propus-me a demonstrar como este Carisma foi relido à luz do Vaticano
II.
Estou convencido de que ponto de partida para uma boa reflexão sobre o lugar
que o nosso Carisma ocupa na vida da Igreja é a consciência de que o Concílio
Vaticano II, apresentando uma nova visão
do mundo e da Igreja, modificou radicalmente o sentido do conceito de missão.
Mesmo sem apresentar muitas referências explícitas, nossa Constituição supõe a visão de Igreja e de missão do Vaticano II.
A partir do Vaticano II a Igreja se reconhece inserida
no mundo e profundamente solidária com tudo o que é humano. Acreditando que o Espírito de Deus dirige a história e fomenta a sede de
paz, justiça e solidariedade dos indivíduos e povos (cf. GS 26), a Igreja deseja compartilhar as alegrias e esperanças, tristezas e angústias dos homens e mulheres, sobretudo dos pobres e daqueles que sofrem (cf. GS
1). Assim, a Igreja reconhece e afirma a
necessidade de conhecer e compreender o mundo em que vivemos, sua índole muitas
vezes dramática, suas expectativas e seus desejos (cf. GS 4).
O Concílio Vaticano II desenvolve novos
aspectos da doutrina sobre Igreja, e o primeiro desses aspectos é a noção
de Igreja como povo messiânico de Deus,
inserido e peregrino no mundo, convocado
a anunciar e promover o reino de de Deus sendo dele sinal e gérmen e constituindo-se
sacramento de unidade do inteiro gênero humano (cf. LG 1, 5, 9). Esse povo tem Cristo como cabeça, a liberdade como
condição, o amor como lei e o Reino de Deus iniciado já na terra como objetivo.
Mesmo aparecendo às vezes como pequeno, fraco e insignificante, esse
povo é princípio
eficaz de unidade, esperança e salvação para todo o gênero humano, pois
Cristo o assumiu como seu instrumento, o estabeleceu como luz do mundo e sal da
terra e enviando a todo o universo (cf. LG 9).
Um segundo elemento da eclesiologia
conciliar é o conceito de Igreja local.
“São Igreja de Cristo todas as
comunidades legítimas de fiéis, espalhadas por toda a parte, em torno de
seus respectivos pastores. Lá onde estão, são,
em plenitude, o novo povo chamado por Deus, no Espírito Santo. Cristo está presente em todas essas
comunidades, por pequenas e pobres que sejam, mesmo quando vivem no isolamento,
pois a participação no corpo e no sangue de Cristo nos transforma naquilo
que tomamos” (LG 26). Com as Igrejas locais e por meio delas se forma a única
Igreja Católica.
Assim, a missão
da Igreja é situada de modo novo no âmbito da Igreja local e tem nela seu
sujeito fundamental. No Decreto Ad Gentes,
o capítulo dedicado ao papel missionário das Igrejas precede o capítulo
dedicado aos institutos e obras missionárias. É através do empenho de cada
Igreja particular que que a natureza missionária da Igreja se realiza. Isso
significa que as Igrejas jovens também
podem e devem ser missionárias.
“Para despertar o zelo
missionário é conveniente que as novas Igrejas se disponham quanto antes a
participar da ação missionária da Igreja universal, enviando também elas
missionários que anunciem o Evangelho em todo o mundo, apesar da penúria do
clero. A plena comunhão com a Igreja universal requer que as Igrejas
particulares participem ativamente da missão da Igreja junto aos povos” (AG
20).
Por fim, na perspectiva aberta pelo Vaticano II, a missão compete a todo o povo de Deus, e,
no interior dele, os leigos e leigas
adquirem um valor cada vez maior (cf. AG 21). “O apostolado dos leigos é participação na missão salvadora da Igreja.
Todos estão qualificados pelo Senhor ao exercício desse apostolado, através do
batismo e da confirmação. Os leigos são especialmente chamados a tornar a
Igreja presente e ativa nos lugares e nas circunstâncias onde somente por eles
pode atuar o sal da terra” (LG 33). Como o mandato missionário de Jesus
não exclui os leigos, estes têm o direito
e o dever de se empenharem de forma individual ou associada para que o anúncio
da salvação seja conhecido e acolhido, especialmente naquelas situações
onde as pessoas só poderão ouvir o Evangelho e conhecer Cristo através deles
(cf. AA 6).
É preciso lembrar, entretanto, que o papel dos leigos e
leigas na missão não se restringe ao importante e indispensável engajamento nas
obras de formação e desenvolvimento humano. Eles são convidados a colaborar nas
atividades paroquiais e diocesanas, especialmente na catequese, assim como
a participar e promover as diversas formas de apostolado leigo (cf. AG,
41). João Paulo II pede que, na
atividade missionária, sejam valorizadas, aproveitadas e respeitadas as várias
expressões, índoles e finalidades do laicato: associações do laicato
missionário, organismos cristãos de voluntariado internacional, movimentos
eclesiais, grupos e sodalícios de diversos tipos (cf. RMi 72).
Itacir Brassiani
msf
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