O bom
samaritano (Lc 10,29-37)
Ao acrescentar a parábola do Bom Samaritano ao
anúncio do mandamento maior (Lc 10,29-37), Lucas deixa claro que a vivência do
amor não é algo abstrato, teórico, mas se traduz em práticas bem concretas.
Antes de procurar um próximo para amar, importa tornar-nos próximos através da
misericórdia, do amor solidário (Lc 10,29.36-37).
Depois de lembrar que a segunda parte do grande
mandamento é amarás o teu próximo como a ti mesmo (cf. Lc 10,27), o escriba
volta com outra pergunta: “E quem é meu próximo?” (Lc 10,29). Ele pretende
colocar limites, fronteiras para o amor, isto é, escolher alguém para amar.
Então, em vez de teorizar sobre quem é o próximo, Jesus conta a parábola do Bom
Samaritano e, no final, novamente devolve a pergunta ao doutor da lei.
O sacerdote e o levita (auxiliar dos sacerdotes nas
celebrações do templo), ao se depararem com uma pessoa assaltada e ferida
gravemente, observam-na e seguem adiante, passando pelo outro lado do caminho
(Lc 10,31-32).
Chega, então, um samaritano que estava de viagem.
Samaritano é quem vivia na Samaria, que ficava entre a Galileia e a Judéia. O
desprezo pelos samaritanos por parte dos judeus é antigo e se deve a razões
políticas, étnicas e religiosas. Os judeus consideravam-se mais fiéis a Deus do
que os samaritanos, a quem acusavam de idólatras e impuros. O fato é que a
religião oficial dos judeus foi se estruturando em torno do templo, da lei, dos
sacrifícios, tornando-se um ritualismo formal, sem uma prática consequente.
Enquanto isso, os samaritanos tinham o êxodo como um dos centros de sua
teologia. Era muito forte a experiência com o Deus libertador, cuja
espiritualidade dava mais importância à justiça e à misericórdia. Esperavam,
inclusive, um messias como o profeta Moisés e não um descendente do rei Davi,
como era esperança dos judeus. A vida das pessoas é o que mais importa. Por isso,
a atitude do samaritano é tão diferente da dos outros dois.
Ao agir dessa forma, o sacerdote e o levita
pretendiam garantir sua proximidade com Deus, pois eram funcionários no templo.
Preocupavam-se com sua pureza ritual, conforme exigia a lei, os dogmas e a
tradição, em função dos serviços do culto e dos sacrifícios, embora estivessem
saindo de Jerusalém e não indo para o templo. O samaritano, ao contrário, nem
no templo dos judeus podia entrar. E Jesus colocou justamente este samaritano
como exemplo de quem se torna próximo (Lc 10,33-34). Ao apresentar o
samaritano, que sequer perguntou quem era a vítima do assalto, fazendo tudo o
que ela precisava, Jesus quer ensinar que o amor não pode ter limites, nem
fronteiras.
Parábolas são narrativas figuradas e também querem
transmitir uma mensagem através de comparações a partir de situações do
cotidiano. Nesta parábola, o bom samaritano também é uma figura de Jesus cheio
de compaixão e de misericórdia. Nele, Deus se encarna para libertar de toda
opressão. O preço, já pago com sua vida doada na cruz, nos leva a viver um amor
gratuito e desinteressado. A vítima no assalto são os doentes, pobres, cegos,
todas as pessoas excluídas. A pensão representa a comunidade a quem Jesus pede
para ter a mesma prática libertadora que ele: chegar perto, ver, mover-se de
compaixão, aproximar-se, tratar as feridas, acolher, cuidar, tornar-se
próximo...
Agora, fica o convite para nós: Toma conta dele!
(Lc 10,35). “Vai e faze tu a mesma coisa” (Lc 10,37). Sede misericordiosos como
o vosso Pai é misericordioso com quem tem suas vidas ameaçadas, ainda hoje, à
beira dos caminhos (cf. Lc 6,36).
Ildo Bohn Gass
Nenhum comentário:
Postar um comentário