Um olhar para a sociedade na
perspectiva de Laudato Sí
Hoje, terça-feira, segundo dia do nosso Curso, o Professor Paulo Cesar
Carbonari nos guiou na busca de uma compreensão crítica da sociedade de hoje.
Deixou claro desde o início que queremos compreender a sociedade para interagir
com alguns sujeitos sociais e intervir sobre ela numa perspectiva de mudança e
emancipação. Lembrou também que toda analise nos coloca diante de uma realidade
muito complexa, com múltiplos sujeitos, processos e fatores interconectados.
Por maior que seja nosso esforço para articular estes diversos aspectos,
dificilmente chegaremos a uma apreciação correta e completa de cada elemento da
realidade. Não é possível desenhar um mapa em escala 1:1! Todo estudo ou
interpretação é a tentativa de representar a realidade em uma escala diferente
de 1:1. Nenhum conceito consegue abarcar a totalidade fluída da realidade.
Na primeira parte da sua reflexão o Paulo Carbonari ajudou-nos a olhar
para a sociedade com o olhar encíclica Laudato
Sí, do Papa Francisco. Para o Papa, uma abordagem ecológica é sempre uma
abordagem social (LS, 49), e isso supera e contesta o que a modernidade nos
propôs ao separar natureza e cultura. Compreender o humano significa
compreender a natureza, e vice-versa.
Um desafio urgente é proteger nossa casa comum e unir a família humana
na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois as coisas podem
mudar (LS 13). Precisamos de um debate que uma a todos em vista do futuro do
planeta, porque o desafio ambiental interpela a todos (LS 14). Este é um
desafio grande, urgente e bonito! Vivemos num tempo de aceleração das mudanças
na humanidade e no planeta, junto com a intensificação dos ritmos da vida e do
trabalho (LS 18). Sendo algo desejável, a mudança é preocupante quando se transforma
em deterioração do mundo e da qualidade de vida de grande parte da humanidade.
Eis a seguir alguns elementos que, segundo o Papa Francisco, marcam a
sociedade mundial atual.
Poluição e mudanças
climáticas: Este não é um problema estritamente ambiental, mas
social e econômico, para o qual a tecnologia, ligada às finanças, não tem
solução, pois não considera as múltiplas relações entre todas as criaturas. O
mundo se tornou um imenso deposito de lixo. Vivemos uma situação de aquecimento
do planeta, com consequências efetivas e trágicas, e este é um dos principais
desafios para a humanidade, até porque as pessoas e povos mais pobres são as
maiores vítimas.
A questão da água: A agua é um recurso escasso, e
o que se percebe hoje é que há um aumento do consumo e uma privatização do seu
controle. Segundo o Papa, já ultrapassamos o limiar da responsabilidade no uso
da agua, e isso sem termos resolvido o problema da pobreza (LS 27-30).
A perda da biodiversidade: Esta é mais uma consequência das formas imediatistas de entender a
atividade econômica nos aspectos de produção e consumo. O Papa insiste que as
diversas criaturas possuem um valor em si mesmas, e não apenas como recursos em
vista do ser humano, e menos ainda, para a atividade econômica. A diversidade
às vezes nos parece caos (LS 32-33).
Deterioração da qualidade de
vida humana e degradação social: O modelo atual
de desenvolvimento e a cultura do descarte tem consequências nefastas sobre o
ser humano e sobre os grupos sociais. As cidades se tornaram nocivas à vida
humana, como consequência da produção de dejetos e das necessidades de
locomoção, assim como da privatização dos espaços (LS 44-46). Os meios tendem a
substituir as relações reais pelas relações mediatizadas, e isso também para a
deterioração da qualidade de vida.
A desigualdade planetária: A degradação ambiental leva à degradação humana e à desigualdade (e
isso diz mais que a simples pobreza), que implica na morte prematura dos
pobres, na luta desigual pelos recursos.
Mas estes temas não tem espaço na agenda mundial. Falta consciência
clara dos problemas que afetam particularmente os excluídos, que são
considerados como apêndice ou efeito colateral (LS 49). A única estratégia para
combater a desigualdade/pobreza é a política do controle de natalidade. A dívida externa transformou-se em
instrumento de controle, mas não se dá o mesmo sobre a dívida ecológica.
A fraqueza das reações: Temos até bons diagnósticos, mas enfrentamos enormes dificuldades de
visualizar alternativas e mobilizar forças.
Faltam-nos lideranças esclarecidas e aglutinadoras, que ajudem a dar
respostas às gerações atuais sem prejuízo das gerações futuras. A tendência,
inclusive das cúpulas internacionais, é reduzir-se a declarações superficiais, a
ações filantrópicas isoladas e a uma sensibilidade difusa. Quem pensa diferente,
exige mais e propõe soluções mais radicais é visto como incômodo e romântico
sonhador. Cresceu a sensibilidade ecológicas das pessoas e populações, mas não
em grau suficiente para mudar os hábitos nocivos (LS 55).
Diversidade de opiniões: Existem diferentes perspectivas e linhas de pensamento sobre a questão
social e ecológica, e isso é bom, na medida em que buscam dialogar e
articular-se e entre si. Não existe um só caminho de solução. A esperança nos
estimula a reconhecer que sempre é possível mudar de rumo, que a situação tem
uma saída, mas o ponto de ruptura, adverte o Papa, está ameaçadoramente
próximo.
Itacir Brassiani msf
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