Em Nazaré, Deus assume radicalmente a condição humana.
A grandeza, a fama e o
poder sempre nos fascinam. Evitamos, como podemos, a fraqueza, a pequenez e a
humildade. A luta quase irracional por uma medalha nas olimpíadas ilustra muito
isso muito bem. Os ídolos nos parecem modelos dignos de serem imitados, mesmo
quando escondem suas origens humildes, enganam o fisco ou desabam ruidosamente.
Mas o caminho da humanização não passa por estas veredas. Jesus de Nazaré
define para sempre seu caminho de Deus: o ser humano comum, sem nenhum outro
título ou honra.
Existem pessoas que
são desprezadas simplesmente por causa do gênero ou da orientação sexual:
mulheres constantemente humilhadas por uma arcaica e violenta cultura patriarcal
e pessoas homo afetivas caçadas como feras perigosas ou abjetas. Existem também
grupos humanos que são desprezados por questões étnicas e raciais: negros que
carregam as marcas da escravidão como se dela fossem culpados; povos indígenas
catalogados como primitivos ou selvagens, exemplares exóticos de um tempo que
não existe mais ou entraves para o excludente e predatório desenvolvimento
branco; imigrantes enxotados como lixo; etc.
Apesar dos títulos e
imagens de poder que a história associou a ele, Jesus de Nazaré partilhou a
sorte das pessoas comuns, desprezadas e marginalizadas. Ele não fez coro com os
soberbos e satisfeitos, nem se mostrou indiferente ao destino das pessoas
humilhadas. Nasceu numa estrebaria, habitou numa cidade insignificante e numa
região desprezada, foi trabalhador braçal, aproximou-se e misturou-se aos
grupos sociais suspeitos, foi preso e executado entre condenados. Em Nazaré,
sua cidade Natal, Jesus era conhecido como um carpinteiro, e seus familiares
eram pessoas muito humildes, gente muito comum.
O evangelho deste
domingo mostra a admiração e a inquietação dos conterrâneos de Jesus sobre a
origem do seu carisma. Como conheciam a Jesus desde pequeno, perguntavam-se:
“Onde foi que arranjou tanta sabedoria? Esse homem não é o carpinteiro, o filho
de Maria?” Do ponto de vista da origem, Jesus não poderia ser o que dava a
impressão de ser. Para seus conterrâneos, a sabedoria não poderia vir de
pessoas comuns e humildes como eles. Por mais que o ensinamento e as ações de
Jesus impressionassem, sua pertença a um povoado marginal e a uma família de
trabalhadores era como uma pedra de escândalo.
Jesus fica
impressionado com a visão estreita dos seus conterrâneos e contemporâneos, com
a influência que a ideologia da superioridade das pessoas cultas e poderosas
exerce sobre os humildes habitantes da sua aldeia. Por trás dessa influência
danosa está a ideia da inferioridade e impotência dos pobres, da sua radical e
eterna dependência de benfeitores poderosos. Como tantos outros, aquele povo
simples havia interiorizado e assimilado a insignificância que as elites lhes
atribuíam. O que mais surpreende, é que parece que esse escândalo atinge os
próprios familiares e parentes de Jesus.
É isso que deduzimos
do provérbio citado por Jesus: “Um profeta só não é estimado na sua pátria, entre seus parentes e familiares...”
Aqueles/as que conheciam suas raízes camponesas e suas mãos calejadas pelo
trabalho na carpintaria não conseguiam reconhecer em Jesus os traços do Profeta
ou do Messias anunciado esperado. Mas, para Jesus, o escândalo dos habitantes
de Nazaré diante da sua origem humilde é falta de fé, pois a fé é a abertura
essencial que permite reconhecer a presença de Deus nas pessoas simples,
acolher as surpresas e a ação inusitada de Deus que se manifesta onde e quando
menos se espera.
Chamando a atenção dos
cristãos de Corinto, Paulo afirma que prefere orgulhar-se de suas fraquezas e
não de seus méritos. “Eu me alegro nas fraquezas, humilhações, necessidades,
perseguições e angústias por causa de Cristo.” Ele tem a convicção de que a
força de Deus se revela na humana fraqueza, e, por isso, não corre atrás de
revelações e dons extraordinários. Todos aqueles/as que realmente acreditam em
Jesus Cristo seguem o caminho do amor que serve, do amor “a fundo perdido”, sem
se importar com o sucesso e o retorno. Os cristãos sabemos que seguimos um
servo, e não um patrão!
Jesus de Nazaré, carpinteiro numa aldeia
insignificante, escândalo para os próprios conterrâneos e familiares, ensina-nos
a apreciar a fraqueza e viver com humildade. Ajuda-nos a manter nossos olhos
fixos em ti, nosso Senhor e Servo. Como tu, queremos confiar na liberdade e na
força que nos vem do Espírito do Pai e da tua Palavra, e não em nosso poder de
convencimento ou nas ações espetaculares. E não nos deixes esquecer que tu
compartilhas nossas origens e não te envergonhas de nos chamar de irmãos e
irmãs. Assim seja! Amém!
Itacir
Brassiani msf
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