A Paz é uma aspiração comum a toda a humanidade
É muito
significativo começar um ano novo civil com um dia dedicado à promoção da Paz.
Mesmo tendo seu jeito próprio de festejar o início de um novo ano – dedicando-o
a Maria, Mãe de Deus – a Igreja Católica se engaja nesta iniciativa e, há 46
anos, oferece também, Jornada Mundial
pela Paz (JMP), uma breve reflexão. O tema proposto pelo Papa para a JMP de
2013 é inspirado no Sermão da Montanha: “Felizes os que promovem a Paz” (Mt
5,9), colocando em foco tanto a pessoa que promove a Paz como as circunstâncias
ou os componentes culturais e econômicos deste precioso valor humano.
A Paz entre avanços e recuos
Bento XVI
lembra que, apesar do paraíso terrestre prometido pelos promotores da
globalização econômica, a história recente e o momento atual da humanidade traz
as marcas de conflitos sangrentos e de ameaças de guerra. Mas existem também as
tensões provocadas pelas desigualdades entre ricos e pobres, pelo capitalismo
financeiro sem regras de controle, pelo predomínio de uma cultura
individualista e egoísta, além das diversas formas de terrorismo e de criminalidade
internacional.
Por outro
lado, lembra o Papa, as inúmeras iniciativas que enobrecem o mundo testemunham
que a vocação natural da humanidade é a
Paz. “Em cada pessoa, o desejo de Paz é uma aspiração essencial e coincide,
de certo modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida.” O
mais natural e essencial da pessoa humana não é ser para o outro um lobo, mas
um companheiro. A solidariedade humana está acima dos valores nacionais e dos
interesses institucionais, inclusive das religiões.
Uma aspiração radicalmente humana
Sendo
aspiração comum e essencial ao gênero humano, a Paz não se realiza senão com a
ativa contribuição de cada pessoa. Ela implica também a construção de uma convivência humana baseada na verdade, na
liberdade, no amor e na justiça. E depende do reconhecimento teórico e
prático de que a humanidade é uma única família. Quando desaparece esta
convicção fundamental, abre-se a porta a todo tipo de indiferença, dominação e
violência.
Assim,
podemos afirmar que a promoção da Paz é
uma prioridade que deve ser colocada acima de todo e qualquer interesse
institucional, inclusive das religiões. Nesta perspectiva, quando o anúncio
de Jesus Cristo comporta o risco de criar divisões e tensões entre os povos,
sem renunciar à fé que temos nela, precisamos enfatizar o testemunho de acolhida e de compaixão sem fronteiras
que aprendemos dele. Ou não é verdade que Jesus Cristo deu a vida para que
todos os seres humanos sejam reconhecidos como filhos e filhas de Deus?
Por que não começar por aquilo que une?
Infelizmente
as instituições religiosas que se apresentam e atuam em nome de Jesus nem
sempre levam isso a sério. A própria reflexão proposta pelo Papa Bento XVI
corre o risco de fomentar divisões em vez de juntar forças pela paz. Ele tem
razão quando ensina que a realização do
bem comum e da Paz percorre o caminho do respeito à vida humana considerada
na multiplicidade dos seus aspectos, mas sucumbe aos estreitos limites do
moralismo quando enfatiza sobremaneira a vida intrauterina e o seu desfecho
natural.
É verdade
que o aborto, culturalmente e
politicamente promovido como direito e a eutanásia
anunciada como se fosse o evangelho do bem viver são expressões violentas de um estilo de vida totalmente ensimesmado e sem
qualquer atenção aos outros e aos mais frágeis. Mas é possível sim promover
a Paz começando por outras iniciativas compartilhadas mais universalmente,
para, mais tarde e à base de um diálogo no qual todos falam e todos escutam,
chegar a estas questões sobre as quais ainda vigem controvérsias.
Como é seu costume, Bento XVI não deixa também de se referir ao tema do casamento homoafetivo, um refrão
dissonante que aparece na maioria das suas intervenções. Para o Papa, esta é
uma forma radicalmente diversa de união que prejudica, desestabiliza e
obscurece o caráter peculiar e a insubstituível função social do matrimônio.
Afirmando que a união matrimonial exclusiva entre um homem e uma mulher está
inscrita na natureza humana – faz parte do direito natural, anterior a qualquer
sistema religioso – Bento XVI se esquece que quem está definindo o que é
‘natural’ é a moral católica... E aqui, em nome da promoção da Paz, a mensagem
acaba provocando desnecessárias tensões e divcergências.
Itacir
Brassiani msf
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