Eis que chegamos à novena que antecede o Natal de
Jesus. “Alegrem-se os céus e exulte a terra, porque o Senhor nosso Deus virá e
terá compaixão dos pequeninos” (Is 49,13). Jacó, o patriarca que enganou Esaú, seu
irmão de sangue, para ficar com o privilégio da primogenitura, eleva
o olhar e visualiza o futuro: imagina seu povo, historicamente
minoritário, frágil e oprimido, firmemente estabelecido na liberdade, livre de
ameaças, solidário e soberano. E o faz recorrendo a imagens próprias da
monarquia. A comunidade de Mateus, por sua vez, tendo presente a vida e a morte
de Jesus já transcorridas, convida os cristãos a olhar para trás.
Por trás do martelante refrão “fulano gerou sicrano” está a firme convicção de
que, em Jesus de Nazaré, Deus assume a condição humana até as últimas
consequências. Deus não desce ao mundo de pára-quedas; ele está
presente no DNA que sustenta e dinamiza a vida humana, e nada rejeita da sua
condição histórica. Mais ainda: assume sem receio entre seus antepassados
homens de vida ambivalente; assume inclusive como pertencentes à sua família,
sem dar a mínima para os calafrios dos puristas e moralistas, mulheres
excluídas e marginalizadas como a estrangeira Tamar, a prostituta Raab, a pagã
Rute a mulher que o rei Davi roubou do soldado Urias. Em Jesus de Nazaré, filho
de Maria e de José, Deus assume as peripécias humanas presentes na construção
dos diversos povos, nos sofridos exílios e nos indestrutíveis sonhos de
liberdade e solidariedade. Mas, mesmo enraizando-se na humanidade profunda, Deus
não se submete aos nossos desejos e manias de poder, e rompe com o patriarcalismo
ao dispensar a concorrência do macho e patrão no nascimento de Jesus. A
genealogia, centrada na figura do pai e chefe, acaba virando pó diante da nota
que diz: “Jacó gerou José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que
é chamado o Cristo” (Mt 1,16). Onde foi parar o papel gerador central do
patriarca? Esta é uma das faces mais impressionantes da Boa Notícia do Natal:
Deus derruba os poderosos dos seus tronos e celebra a dignidade dos
humilhados... acolhamos, pois, com alegria, o anúncio do profeta Ageu: “Eis que
vem o desejado de todas as nações: ele encherá de glória a casa do Senhor” (2,8).
(Itacir Brassiani msf)
Nenhum comentário:
Postar um comentário