Eis que
entramos na derradeira semana da caminhada para o Natal. A expectativa é mais
intensa, as atividades se acumulam, as preocupações nos agitam. O que ainda
está faltando? Enviar os cartões natalinos aos amigos? Comprar presentes para
os afilhados, sobrinhos, pais, irmãs,
vovôs ou netos? Renovar o estoque de carnes e doces? Comprar roupa nova para a noite feliz? Preparar o pinheiro e o
presépio na sala?... A Visita esperada pode já estar batendo à porta, e os
preparativos não podem impedir a acolhida, o diálogo e o comprometimento
pessoal com Aquele que está sempre chegando.
Com o
episódio de Davi e de Natã, não esqueçamos que a pressa é vizinha da
superficialidade, e que ambas são um perigo para a fé lúcida e operante. O
Advento é um convite à escuta despojada e ao diálogo aberto: escuta de Deus que
fala, inclusive à margem dos livros e canais de TV, no silêncio do recolhimento
e na contemplação profunda dos sinais dos tempos; diálogo tecido com os fios do
intercâmbio, dos encontros com os diferentes, das ações solidárias, das preces
engajadas. E é aqui, na espiritualidade do Advento, que emerge com limpidez a figura de Maria.
À margem
dos grandes acontecimentos, na periferia dos lugares importantes, no anonimato
suspeito de Nazaré, Maria é capaz de discernir a Palavra de Deus na tenda da
sua casa. E a fala de Deus começa apreciando e elogiando a beleza daquela que
seria sua desejada morada, da arca que abrigaria o sacramento da sua Aliança
definitiva. “Alegre-se, cheia de graça! O senhor está com você!” No coração do
diálogo, uma proposta, um pedido tão exigente quanto irrecusável: “Você vai
ficar grávida, terá um filho e dará a ele o nome de Jesus. Ele será grande e
será chamado filho do Altíssimo.”
Maria está
pronta a engajar-se de corpo e alma no desejo de Deus, e discute apenas o modo
como isso poderá ser feito. Sua preocupação não é contruir um templo para que
Deus habite no mundo, ou decorar uma bela árvore de natal... Ela aceita ser a morada
de Deus e coloca-se a serviço dele. Ela sabe que os Novos Céus e a Nova Terra
costumam emergir onde e quando menos se espera: desertos florescem; estradas
tortuosas se fazem caminhos planos; estéreis engravidam; virgens dão à luz;
pobres recebem boas notícias... Deus não esquece de ser misericordioso, e
cumpre aquilo que promete.
Mas o
poder de Deus se mostra em mediações pobres! Ele cumpre suas promessas através
das pessoas que nele confiam e a ele se entregam. É isso que nos mostra Maria,
a vida das comunidades dos primeiros discípulos, e milhões de homens e mulheres
pelos séculos a fora. Deus faz sua parte e cumpre o que promete, mas espera que
façamos a grande parte que nos toca. Não nos preocupemos em construir templos,
palácios e presépios... Deus prefere morar em nós, mesmo que sejamos pouco mais
que pobres estábulos. Ele vem como criança para despertar em nós a ternura a
solidariedade.
A
preparação do Natal é uma tarefa que nos envolve da cabeça aos pés, da pele ao
coração. Mas as luzes só têm sentido se forem expressão de um coração
iluminado. Os presépios adquirem beleza na humana hospitalidade que acolhe
indistintamente. Os presentes têm sabor na medida em que fazem de nós mesmos um
dom, uma presença gratuita e solidária, e não levam a esquecer Aquele que é a Presença
de Deus na carne humana. O Natal é uma festa familiar, mas não pode se
restringir ao aconchego de quatro paredes, ao cálido clima doméstico, fechado
ao mundo, indiferente aos outros.
Com
Paulo, demos glória Àquele que pode nos confirmar na fidelidade ao Evangelho
anunciado na carne de Jesus Cristo. Aquilo que estava escondido em doutrinas e
ritos complicados, separados da vida ou opostos a ela, se tornou claro no mistério
da encarnação e se tornou acessível a todos os povos e religiões. Deus é
parceiro da humanidade, faz nela sua morada e scuscita e sustenta iniciativas
de humanização. Ele não se importa com a pureza moral ou social, mas com as
dores e necessidades dos seus filhos. A ele prestamos serviço e culto, cuidando
dos nossos semelhantes.
Deus pai e mãe, tu que fecundas nossa
generosidade e fazes surgir água da rocha mais dura: suscita em nós a alegre
disponibilidade de Maria, a fim de que preparemos em nós mesmos, nossas
famílias, comunidades e Igrejas, um lugar para teu Filho e um espaço para teu
povo. Livra-nos da doce tentação de construir templos e presépios, como se
gostasses disso. Desperta em nós a atitude de José, para que sejamos capazes de
acolher o bem que é feito mesmo à margem dos nossos planos. E que teu amor e
tua fidelidade se renovem nas mil alianças históricas que esperam por nosso
sim. Assim seja! Amém!
Itacir Brassiani msf
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