Ouvidos abertos, corações ardentes e pés a caminho!
(Meditação a
partir dos apelos de Nossa Senhora da Salette)
Um convite desejoso de uma resposta
Desde
o crucifixo luminoso que pende no peito de Maria, Jesus nos olha com ternura,
nos fala com eloquência e permanece de braços abertos. Seus braços, sustentados
pela intercessão da Bela Senhora (como os de Moisés foram sustentados pela
oração de Aarão e do povo hebreu), não cedem ao peso dos nossos descaminhos e desistências.
“Venham, aproximem-se, não tenham medo! Tenho uma coisa importante para lhes dizer”, fala a Bela e dolorosa Senhora em trajes de humilde camponesa. “Escutem! Entendam! Levem a sério o que eu lhes digo”, diz Jesus antes e depois da parábola do semeador generoso. “Oxalá vocês escutem hoje a Sua voz”, diz o Senhor em tom de lamento pela boca do salmista.
Abramos nossos ouvidos à Notícia Boa
O
poema-canção do Pe. Loacir nos recorda que, lá na montanha da transfiguração uma
Voz diz “este é o Filho amado que traz salvação, reconciliação, e deve ser
escutado”. E na montanha da França, a Mãe vem lembrar o que ele nos quis e o
que nos diz. O que o seu Filho, o Enviado do Pai, nos diz em nome dela e em
nome dele?
Ele
nos diz, de modo silencioso e eloquente, que Deus tem rosto de mãe que chora,
que se veste como humilde e sofrida agricultora, como mulher vitimada por
relações dominadoras nas mãos dos patrões e dos machos. Ele nos diz que nosso
Deus é um Deus crucificado por amor, um Deus que, do alto da cruz, mantém seu
olhar e seus braços abertos em nossa direção.
Maria
nos convida a ir além daquela Montanha, e acolher tudo o que o Filho nos
ensina. Ele nos revela que sonha e semeia generosamente a boa semente dos seus
Sonhos em todos os terrenos, em todos os tempos, em todos os corações, que é o
Enviado do Pai para socorrer a ovelha perdida, para acolher o filho que volta, para
trazer os últimos para os primeiros lugares.
Ele nos
anuncia que seu Pai e nosso Deus é um Deus amigo, próximo, compassivo, que se
importa conosco, e que não se importa com os riscos de sua compaixão profética,
pois tem absoluta confiança em nós, pois conhece nossa condição. Ele não é um
Deus indiferente à fome e a outros tipos de sofrimento, e porque nos ama,
também nos chama, nos reúne, nos forma, nos envia e nos acompanha.
Ele
nos diz que seu Pai e nosso Deus ama o direito e a justiça, é palavra boa aos
pobres, é mão que liberta os cativos, é presença consola os que choram. E nós
somos sua roça (“carvalhos da justiça, plantação de Javé”), como diz o profeta
Isaías, e Ele nos semeia, nos faz germinar e nos cultiva amorosamente.
Ele
insiste que Deus tem um Desejo e um Plano, e esse Desejo e esse Plano, são desde
sempre, que os gritos e cantos de júbilo tomem o lugar dos lamentos e do luto,
que os famintos sejam saciados, que os humilhados sejam elevados, que sejamos
um povo de irmãos, um povo que não reconhece fronteiras e muros que separam e
hierarquizam pessoas e nações.
Jesus
nos ensina que os ciclones, as secas, as guerras, as doenças e a fome que ferem
e matam seus filhos e filhas não podem vir dele, assim como a frustrações no
cultivo do trigo, das batatinhas, das uvas e das nozes e a morte de crianças não
foram vontade dele na França de 1840. Como a serpente que castigava o povo no
deserto foi transformada em sinal de salvação, esses acontecimentos podem abrir
nossa consciência para novos caminhos e novas soluções.
Jesus também dele a voz que diz: “Convertam-se e acreditem no Evangelho! Dai-lhes vós mesmos de comer! Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça! O maior é aquele que mais serve! Ninguém pode servir a dois senhores. Tudo o que vocês fazem ou deixam de fazer a um desses pequeninos necessitados é a mim que fazem ou deixam de fazer”. Essas Palavras retinem em nossos ouvidos chegam a arder em nosso coração?
Olhemos com atenção para o nosso chão
A
Maximino e Melânia, Maria se manifesta descendo e mostrando conhecimento da
situação miserável que atormentava seu povo, mas da qual ambos tinham pouca
consciência. Os dois ignoravam também a relação entre os males da sociedade e a
fé em Jesus Cristo. Por isso, “a Mãe vem lembrar o que o Filho quis, e chora
porque os filhos não ouvem o que o Filho diz”.
No evangelho
que ilumina nossa celebração, o Filho diz e assegura que a semente é boa, mas o
terreno é complexo e, frequentemente, duro, hostil, estéril e até violento. E
isso impede que cresça, tome corpo e frutifique. Então, precisamos nos
perguntar: o que impede que a boa semente da vida plena para todos germine,
cresça e frutifique em você, na sua família, na sua comunidade, o que impede
que ela se desenvolve na Igreja e em todos nós?
A
realidade nos mostra que há terrenos esterilizados pela superficialidade: são as
pessoas, inclusive muitas que gostam de se apresentar como cristãs e católicas,
que não têm tempo para os outros, que não dão ouvidos à Palavra de Deus, tanto
àquela que está na Bíblia como àquela que Deus continua dizendo mediante. Uma
espécie de negacionismo nefasto os leva a negar os estudos científicos que
demonstram claramente que estiagens e ciclones estão ligados ao aquecimento das
águas, resultado da ação humana predatória ou do descaso com a natureza.
Há
terrenos fustigados pelo medo dos riscos e das perseguições,
que vivem repetindo que “não vale a pena correr riscos”, que “é melhor cada um
ficar na sua, que “todos têm mais o que fazer”. Tais pessoas e grupos preferem
dar ouvidos às vozes que acusam com força e insistência: “Comunista, interesseiro,
lobo disfarçado de ovelha”. Chegam até a chamar o Papa Francisco de herege e
vagabundo, e ensinar que a justiça social nasce da inveja e é uma ideia que
cheiro a mofo.
E há terrenos contaminados pela sedução do bem-estar-individualista: “Cada um precisa cuidar de si mesmo e da sua vida...” Todos os seus sonhos e desejos se resumem em comprar o último modelo de celular, adquirir o trator mais moderno e mais potente, ostentar o carro do ano ou ser eleito ou nomeado para o cargo mais cobiçado. Parece que a sabedoria é assegurar o próprio futuro e o da sua família, mas quem é sua família, quem é seu irmão? Qual é o futuro que você está preparando?
Somos chamados a escolher
Mas
então, tudo está perdido, não há mais saída, o projeto de Deus fracassou e nada
mais podemos fazer? Não! A primeira porta se abre quando abrimos nossos olhos e
nossos ouvidos. “Escutem! Entendam! Tomem uma decisão! Convertam-se!”
“Quando
alguém ama, por esse amor sofre e se compromete. Isso se confirma no brilho e
na dor da Mãe da Salette”. A mãe de Jesus, falando em nome dele, foi clara: “Se
a colheita se estraga, se existe fome, sofrimento e morte, a responsabilidade é
de vocês! Por outro lado, se vocês se converterem, as pedras e as montanhas se
transformarão em armazéns cheio de trigo”.
E o
próprio Jesus, segundo o evangelho que nos ilumina, é também muito claro: “Se o
Evangelho cai em terra boa, brota e cresce, e produz 30, 60 e 100!” E, em outra
passagem: “Se vocês não se converterem, vão padecer todos do mesmo modo...”
Os
cientistas são igualmente claros: “A humanidade produz alimentos suficientes
para alimentar 6 vezes a população do mundo, o que falta é partilha justa... Se
não mudarmos de forma drástica e urgente nosso estilo de vida, não há futuro
para o planeta, e não haverá sobreviventes para sepultar os cadáveres, nem para
desfrutar das riquezas acumuladas”.
Há um terreno bom, um terreno que escuta, acolhe, entende, compromete-se, arrisca-se, reparte, produz 30, 60 e até 100 por um! Tudo depende de uma decisão, e não de uma fatalidade. Que tipo de terreno você quer ser, que tipo de terreno eu quero ser? Que tipo de obstáculos você precisa, nós precisamos remover?
A decisão é tua, a decisão é nossa!
“Ano
após ano o povo retorna ao teu santuário. Refaz a confiança, renova a esperança
e o ardor missionário. E volta contente porque também sente em sua dor que a
Mãe, quando ama, se chora, por certo, é choro de amor”.
Celebramos
esse acontecimento da fé cristã com os ouvidos abertos, os corações ardentes, e
os pés a caminho. Estamos dispostos a escutar, entender, mudar, praticar,
cuidar, repartir.
Alegramo-nos
por sermos tratados como a plantação de Deus, e queremos que sua Palavra nos
cultive, nos pode, nos limpe, para que saibamos recusar os venenos da indiferença,
da soberba, da fuga. Reconstruamos as ruínas de um povo que se transformou num
campo de inimigos em batalha, promovamos a cultura do encontro fraterno e
solidário.
Tomemos
a decisão que vale uma vida: assumamos o Evangelho de Jesus Cristo como regra
de vida, como terreno bom que acolhe a boa semente; engajemo-nos
incansavelmente na transformação dos modos de pensar e das estruturas sociais e
econômicas, para que o meio ambiente seja protegido, os últimos sejam os
primeiros, os que exercem o poder sejam servidores de todos, os famintos sejam
alimentados e os injustiçados sejam tratados como gente.
Transbordemos
de alegria diante de um Deus que nos ama e aposta na nossa bondade e capacidade
de mudar as coisas. Recuperemos a alegria cristã porque também sentimos em
nossas dores que a Mãe, quando ama, se chora, por certo, é choro de amor”. E transmitamos
tudo isso ao povo de Deus, começando pelos mais próximos e pelos pobres, feridos,
aprisionados, enlutados, desesperados
Com os corações ardentes, saiamos de nós mesmos e participemos dos movimentos, organismos e coletivos que lutam pelo cuidado da terra, pelo alimento na mesa de todos. Espalhemos generosamente as sementes da fraternidade sem fronteiras.
Para
meditar, partilhar e aprofundar:
1)
Ler a mensagem da aparição de Nossa Senhora da
Salette
2)
Ler Isaías 61,1-11, Salmo 94/95 e Marcos 4, 1-10
3)
Que pontos de convergência percebemos entre os
textos bíblicos e a mensagem de La Salette?
4)
Que relações podemos estabelecer entre a mensagem
da aparição, a Campanha da Fraternidade e o Ano Vocacional?
5) Que luzes a mensagem de Salette nos oferece para compreender corretamente a tragédia que se abateu recentemente sobre o Rio Grande do Sul?
Nenhum comentário:
Postar um comentário