sábado, 2 de setembro de 2023

O Evangelho dominical (Pagola) - 03.09.2023

A CRUZ É OUTRA COISA!

É difícil não se sentir perplexo e perturbado ao escutar mais uma vez as palavras de Jesus: «Quem quiser vir comigo, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me». Compreendemos muito bem a reação de Pedro, que, ao ouvir Jesus falar de rejeição e sofrimento, o chama à parte e começa a repreendê-lo. O teólogo mártir Bonhoeffer diz que esta reação de Pedro prova que, desde o início, a Igreja se escandalizou com o Cristo sofredor. Não quer que o seu Senhor lhe imponha a lei do sofrimento.

Este escândalo pode hoje se tornar insuportável para aqueles que vivemos no que Leszek Kolakowsky chama de «cultura dos analgésicos», essa sociedade obcecada em eliminar o sofrimento e o desconforto por meio de todo tipo de drogas, narcóticos e evasões.

Se queremos esclarecer qual deve ser a atitude cristã, temos que entender bem em que consiste a cruz para o cristão, porque pode acontecer que a coloquemos onde Jesus nunca a colocou. Chamamos facilmente de cruz tudo o que nos faz sofrer, mesmo aquele sofrimento causado por nosso próprio pecado ou pela nossa maneira errada de viver. Mas não devemos confundir a cruz com qualquer infortúnio ou desconforto que ocorra na vida.

A cruz é outra coisa. Jesus chama os seus discípulos a segui-lo fielmente e a colocarem-se ao serviço de um mundo mais humano: o reino de Deus. A cruz nada mais é do que o sofrimento que nos advirá como consequência deste seguimento; o doloroso destino que teremos de partilhar com Cristo se realmente seguirmos os seus passos. É por isso que não devemos confundir «carregar a cruz» com posturas masoquistas, a falsa mortificação ou o que Evdokimov chama de ascetismo barato e individualismo.

Por outro lado, devemos compreender bem o que significa negar-se a si mesmo, que Jesus pede para carregar a cruz e segui-lo. Negar-se a si mesmo não significa de modo algum mortificar-se, castigar-se a si mesmo e, menos ainda, anular-se ou autodestruir-se. Negar-se a si mesmo significa não viver pendente de si mesmo, esquecer-se do próprio «ego», para construir a existência sobre Jesus Cristo. Libertarmo-nos de nós mesmos para aderir radicalmente a Ele.

Dito de outra maneira, carregar a cruz significa seguir Jesus disposto a assumir a insegurança, o conflito, a rejeição ou a perseguição que o próprio Crucificado teve de sofrer. Mas nós crentes não vivemos a cruz como derrotados, mas como portadores de uma esperança final. Todo aquele que perder a vida por Jesus Cristo a encontrará. O Deus que ressuscitou Jesus também nos ressuscitará para a vida plena.

José Antonio Pagola

Tradução de Antonio Manuel Álvarez Perez

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