A ONU
incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na
perspectiva da luta por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui
uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à
alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do
recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler,
relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro
foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).
Fome,
terra e acesso aos recursos tecnológicos.
Há pouco tempo atrás a ONU lançou o alerta: 80 países estão no limiar da insegurança
alimentar. Do total de 1,2 bilhões de seres humanos que, segundo os
critérios do Banco Mundial, vivem na
pobreza extrema (ou seja, com menos de 1,25 dólar por dia), 75% vive no meio
rural: ou são trabalhadores migrantes/sazonais e arrendatários (em alguns
lugares da índia, devem entregar 4/5 da produção aos proprietários!), ou são
posseiros sem títulos de propriedade, ou possuem terra em quantidade e de qualidade
insuficiente para produzir aquilo que necessitam.
Em pleno século XXI, quase 90% dos camponeses do
hemisfério Sul dispõem como ferramentas de trabalho apenas de enxada, facão e
foice. Mais de 1 bilhão de camponeses não
dispõe nem de animal de tração, nem de trator. E sabemos muito bem que, quando
a força de tração é duplicada, duplica-se também a área cultivada. Conforme a Organização Meteorológica Mundial, as
colheitas que dependem somente da chuva natural rendem em média 50 kg por
hectare, enquanto que as colheitas nas lavouras irrigadas chegam a 1.500 kg por
hectare (30 vezes mais!).
Sem tração animal ou mecânica, os pequenos
agricultores do Sul ficam confinados na própria miséria. “Diante da situação de
absoluta fragilidade econômica das famílias de sem-terra, a ‘Reforma Agrária
Assistida’, promovida pelo Banco Mundial
em todo o mundo, é uma evidente hipocrisia, uma simples e pura indecência.” (p.
33).
Apenas 3,8% das terras da Africa subsahariana são
irrigadas, e 500 milhões de cultivadores
do hemisfério Sul não têm acesso a sementes selecionadas, nem a adubos
minerais, nem aos adubos orgânicos (uma vez que não possuem animais). E
mais de 25% das colheitas mundiais são destruídas anualmente por interpéries e
roedores. Os silos são raros nos planaltos andinos e na região Sul da Asia.
“Consideram-se alimentos de base o arroz, o trigo e o
milho. Juntos, eles respondem por 75% do consumo mundial. Sozinho, o arroz
cobre 50% deste volume.” (p. 45) Em 2011, como em 2008, os preços dos alimentos
de base explodiram. Em janeiro, o preço
da tonelada de trigo no mercado mundial dobrou repentinamente. Enquanto que em
Paris, Genebra ou Frankfurt, as famílias gastam 10 a 15% das suas receitas com
a alimentação, em Manila (e, de modo semelhante, em todos os países pobres)
este percentual chega a 85%!
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