quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Ousando umaginar diversamente


Charlotte Gilman
O que aconteceria se uma mulher despertasse uma manhã transformada em homem? E se a família não fosse o campo de treinamento onde o menino aprende a mandar e a menina a obedecer? E se houvesse creches? E se o marido participasse da limpeza e da cozinha? E se a inocência se fizesse dignidade? E se a razão e a emoção andassem de braços dados? E se os pregadores e os jornais dissessem a verdade? E se ninguém fosse propriedade de ninguém?



Charlotte Gilman delira. Em 1934 a imprensa norte-americana a ataca, chamando-a de mãe desnaturada. E mais ferozmente a atacam os fantasmas que moram em sua alma e a mordem por dentro. São eles, os temíveis inimigos que Charlotte contém, que às vezes conseguem derrubá-la. Mas ela cai e se levanta, e torna a se lançar pelo caminho. Esta tenaz caminhadora viaja sem descanso pelos Estados Unidos, e por escrito e por falado vai anunciando um mundo ao contrário.

 (Eduardo Galeano, O século do vento. Memória do fogo, vol. 3, L&PM Editores, Porto Alegre, 2010, p. 47) 

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