sábado, 20 de outubro de 2012

Uma destruição massiva: a geopolítica da fome (11)


A ONU incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).

O lucro de poucos às custas da miséria de muitos.

Os oligopólios impõem seus interesses ao mercado mundial de alimentos. Em vista de conseguir um lucro sempre maior e de controlar totalmente o mercado, não duvidam em praticar o dumping e eliminar concorrentes. Assim que os produtores e os mercados locais são destruídos, estas empresas aumentam os preços (como aconteceu recentemente com o mercado de frangos no Camarões).

Vale a pena se deter num caso exemplar desse monopólio. A multinacional Cargill é a líder mundial na industrialização de oleaginosas, de milho e de trigo, e a mais poderosa empresa do mercado de grãos do mundo: está presente em 66 países; tem 1.100 sucursais; possui silos e portos espalhados pelo mundo; controla empresas de transporte intercontinentais; tem mais de 130.000 empregados.

Em 2007 a posição da Cargill era: a segunda maior empresa no mercado mundial de carnes; a segunda mais potente no mercado de carne de porco e de criação de aniamis confinados; a terceira maior produtora mundial de carne de peru; a segunda maior produtora de rações para animais do planeta. Do Brasil ao Canadá, ela controla grande número de abatedouros e, nos EUA, possui 80% dos frigoríficos.

“Graças às suas instalações portuárias e aos seus silos espalhados no mundo inteiro, a Cargill está em condições de estocar enormes quantidades de trigo, soja e arroz, e de esperar que os preços aumentem. Por outro lado, graças à sua frota de navios e aviões, consegue transportar suas mercadorias em tempo record” (p. 160).

A Cargill opera também nas principais Bolsas que negociam alimentos e insumos agrícolas. Como outros oligopólios, em determinados momentos ela desempenha um papel determinante na explosão dos preços dos alimentos e dos insumos agrícolas. Segundo Dan Morgan, especialista nessa área, as cargas dos navios em alto mar podem mudar até 30 vezes de proprietário antes de chegar ao seu destino. (cf. p. 160-161).

Assim, no ano de 2007, a Cargill movimentou 88 bilhões de dólares e teve um lucro líquido de 2,7 bilhões de dólares. Em 2008, ano da grande crise mundial de alimentos, seu movimento subiu para 120 bilhões e seu lucro líquido para 3,6 bilhões de dólares! Ora, entre janeiro de 2006 e junho de 2008, o preço internacional do arroz triplicou, o preço do milho e da soja aumentaram 150% e o preço do trigo dobrou...

A Cargill é também uma das maiores empresas do mercado do algodão. Sua principal fonte de matéria-prima é a Asia Central, particularmente o Ubezaquistão, onde sua filial inglesa tem um escritório de compra. Só ali adquire algodão num montante de 60 milhões de dólares por ano. E não se importa com o fato de que as empresas produoras pratiquem o trabalho forçado de centenas de milhares de crianças no cultivo dos campos de algodão.

Finalmente, a Cargill (como outros oligópólios), atua mediante o controle vertical dos negócios, ou o controle total de uma cadeia alimentar. Por exemplo: ela produz o fosfato na Flórida; com ele, fertiliza as plantações de soja nos EUA e na Argentina; em suas indútsrias, transforma a soja em farinha; transporta esta farinha em seus próprios navios à Tailândia, onde engorda os frangos que produz em suas granjas; estes frangos são insdustrializados em seus matadouros praticamente automatizados; são embalados e traansportados por sua própria frota de navios e aviões e vendidos no Japão, na Europa e nos EUA; os próprios caminhões da Cargill os distribuem nos supermercados dos quais a empresa é importante acionista. (p. 158-162)

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