quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

ANO B | TEMPO COMUM | QUARTO DOMINGO | 31.01.2021

Jesus é a visita libertadora de Deus aos porões da humanidade!

Com a presença de Jesus, a casa de André e Pedro se converte em espaço de acolhida e cura. Jesus desconhece a separação rígida entre espaço público e espaço privado. Sua ação libertadora não respeita fronteiras: supera a oposição entre religião e política; faz menos da divisão entre espaço público e espaço privado; une oração e ação; não respeita a prioridade aos homens em detrimento das mulheres; vai além do moralismo que impõe o respeito às autoridades e faz pouco caso do povo simples; e assim por diante.

Na casa de Pedro e André, Jesus fica sabendo que a sogra do primeiro estava acamada. Aquela mulher anônima é o símbolo da humanidade oprimida por doenças, dominações e doutrinas que discriminam e condenam. Relegadas ao mundo privado, quando adoeciam as mulheres eram ainda mais segregadas, inclusive no próprio espaço doméstico. Ao machismo se juntava a ideologia da impureza. E isso sem falar na visão preconceituosa que até entre nós recai sobre a figura da sogra.

Jesus não faz pouco caso daquilo que seria uma simples febre, não faz de menos por ser a doente uma mulher, nem espera que a conduzam a ele. “Jesus foi onde ela estava, segurou a sua mão e ajudou-a a se levantar.” Este gesto de Jesus é uma espécie de parábola de um Deus que se aproxima da humanidade oprimida para tomá-la pela mão e firmá-la sobre os próprios pés. Num mundo no qual predominava a figura masculina, Jesus se importa com a febre de uma mulher. E mais: rompe as barreiras culturais e toca no corpo de uma pessoa doente.

O gesto de Jesus não se restringe a isso. Numa sociedade que sujeita os mais fracos e mantém multidões na dependência frente aos que detém o poder, Jesus ajuda o povo caminhar com os próprios pés. Aquela mulher, que antes estava segregada e dependente por causa da doença, se descobre livre e capaz de servir. “Então a febre deixou a mulher e ela começou a servi-los.” E não se trata de um simples serviço subalterno ao qual desde muito e são submetidas as mulheres. Ao servir Jesus e os presentes, a sogra de Pedro exerce a diaconia emancipada, característica dos discípulos e discípulas de Jesus.

O episódio deixa a impressão de que Jesus até desrespeita a casa dos seus amigos, e a transforma em lugar de resgate da dignidade e da autonomia de um povo cansado e abatido, doente e oprimido. “À tarde, depois do pôr-do-sol, levavam a Jesus todos os doentes e os que estavam possuídos pelo demônio. A cidade inteira se reuniu na frente da casa...” Como diz o salmista, Deus “cura os corações despedaçados e cuida dos seus ferimentos”. Jesus não se cansa de atender às necessidades das pessoas desamparadas e lhes devolve a possibilidade de cidadania e de vida plena, de um bom viver.

Mas é evidente que Jesus não está receitando um simples tratamento para as doenças, pois não é enfermeiro nem médico. A descoberta e distribuição de uma vacina não acaba com a pandemia! Ele cura, ou seja, reintegra plenamente as pessoas no convívio social, mesmo que isso signifique negar radicalmente as leis que separam e excluem os doentes, considerados impuros e culpados pelo próprio mal-estar. Mas, devolver ao povo a dignidade e autonomia que lhe pertence é um trabalho exigente, e corremos o risco de imaginar-nos autossuficientes, ou de reduzir as pessoas às suas necessidades e carências. E é aqui que entra a oração.

É necessário tomar distância para inserirmo-nos de modo coerente e profundo na missão. Jesus não se deixou envolver pela fama, nem ser dominado pelo que parecia mais urgente. “Todos estão te procurando...” Ele sabe distinguir aquilo que é urgente e o que é essencial. “Quando ainda estava escuro, Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto.” Para Jesus, a oração nunca foi álibi para não se importar com as necessidades do povo, mas seu jeito próprio de manter abertura a todos. A oração foi também a pedagogia que o ajudou a centrar a vida na vontade do Pai, nas pessoas necessitadas, e não em si mesmo ou em sua fama.

Jesus de Nazaré, mestre e libertador de todas as opressões! Tu vens à nossa casa, pois tua Boa Notícia não tem fronteiras. Tu nos ensinas a sair de nós mesmos e de nossas igrejas para estendermos a mão a todas as pessoas encurvadas sob o peso de tantos fardos sanitários, econômicos, culturais e religiosos. Dá-nos a coragem de seguir teu exemplo e fazer do serviço aos nossos povos nosso tesouro e nosso destino, de fazermo-nos fracos com os fracos, tudo para todos. E isso, por causa do Evangelho, cujo anúncio é para nós uma necessidade que vem da profundidade da fé e o motivo das nossas maiores alegrias. Amém! Assim seja!

Itacir Brassiani msf

Livro do Deuteronômio 18,15-20 | Salmo 94 (95) | Primeira Carta de Paulo aos Coríntios 7,32-35 |  Evangelho  de São  Marcos 1,21-28

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