Primeiro Encontro da Igreja
Católica na Amazônia: contexto
“A Igreja está na Amazônia, não como aqueles que têm as malas na mão,
para partir depois de terem explorado tudo o que puderam. Desde o início a
Igreja está presente na Amazônia com missionários, congregações religiosas,
sacerdotes, leigos e bispos e lá continua presente e determinante no futuro
daquela área.”
(Papa
Francisco, aos Bispos do Brasil, Rio de Janeiro, 27 de julho de 2013)
Conscientes
de que falta muito a ser realizado em nossa missão evangelizadora, conforme nos
pede o Senhor da História (cf. Col 1,13-20), novamente nos encontramos em
Manaus, desta vez com a participação de todos os regionais da CNBB que integram
a Amazônia Legal (Norte I, II e III, Noroeste, Nordeste 5 e Oeste II). Sabemos
que temos um mesmo caminho a palmilhar. Lembramo-nos de que Jesus mesmo é o
Caminho (Jo 14,6). Jesus caminha conosco como o fez com os discípulos de Emaús
que exclamaram: “Não ardia o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho,
quando nos explicava as Escrituras!” (Lc 24,32). E não foi adiante, mas “entrou
para ficar” (Lc 24,29). Jesus está na
Amazônia para ficar. E o reconhecemos ao partir o pão.
Neste
caminho comum damo-nos conta de que são comuns os problemas e desafios que nos
interpelam. Confiando em Jesus, presente no meio de nós, queremos formar uma ampla rede integradora de nossas ações pastorais e
evangelizadoras e convocar os irmãos e as irmãs a empenharem-se em favor de um
mundo justo, fraterno e solidário. Queremos convocar também mulheres, e
homens que não professam a nossa fé ou se afastaram de nossa Igreja a
irmanarem-se conosco na defesa da dignidade e dos direitos dos povos da
Amazônia e da criação que Deus em sua bondade e imenso amor confiou ao seu zelo
e seus cuidados (cf. Gn 1,18).
Refletimos
nestes dias sobre problemas que continuam a atingir e causar danos e ameaças à
vida e à existência de pessoas e povos e ao meio ambiente na Amazônia. Ajudados
por estudiosos e especialistas e ouvindo pessoas que sentem na pele os dramas
causados por políticas de dominação em total desrespeito aos legítimos anseios
e necessidades dos povos desta região:
Analisamos
e discutimos a realidade urbana e a
mobilidade humana que tantos sofrimentos têm causado aos povos amazônidas
como o desenraizamento da terra e a perda do patrimônio cultural e religioso
próprio e comum aos povos tradicionais e dos que vêm de outras regiões;
Verificamos
um acentuado crescimento das igrejas
evangélicas e dos sem-religião também na Amazônia, como consequência da
precária presença de nossa Igreja nos movimentos migratórios;
Fomos
informados a respeito dos grandes
projetos implementados na região, de modo especial as hidrelétricas, que
representam uma nova invasão do capital visando explorar as nossas riquezas
naturais e aproveitar o potencial energético de nossos rios, sem olhar para os
prejuízos que causam ao meio-ambiente com sua imensa biodiversidade e a
destruição da vida e da história de muitos povos tradicionais;
O desmatamento contínuo e novamente crescente
das florestas amazônicas nos assusta pelos prejuízos incomensuráveis e pela
ameaça ao equilíbrio ecológico do planeta;
Frente
ao desmatamento, à concentração da terra
e às monoculturas percebemos a urgência da realização da Reforma Agrária e
Agrícola;
Constatamos
o crime impune da prática do trabalho
escravo que ocorre nas empresas do agronegócio e nas áreas de mineração;
Ficamos
horrorizados ante o criminoso tráfico de
pessoas e drogas, sustentado pela ganância, miséria e impunidade, e o
assassinato de jovens;
Ouvimos
ainda os relatos de um representante dos povos indígenas e de um quilombola que
nos falaram de suas organizações, lutas e conquistas e nos alertaram para os
graves riscos de perderem, através da Proposta
de Emenda Constitucional (PEC 215), direitos conquistados em relação à
demarcação e garantia de seus territórios, asseguradas nos Art. 231 e 232 da
Constituição Federal de 5 de outubro de 1988;
Lembramos
ainda que o Art. 68 das Disposições
Transitórias da Constituição Federal reconhece aos remanescentes dos
quilombos a propriedade definitiva de suas terras, devendo o Estado emitir-lhes os
títulos respectivos.
Enfim,
constatamos que o domínio de um sistema único de mercado, o individualismo
típico da cultura/sociedade de hoje e a violência urbana destroem os laços e as relações tradicionais: a família, a
natureza, o mundo dos povos indígenas, dos caboclos, seringueiros,
agricultores, ribeirinhos. Tudo é desagregado e desestruturado e essa realidade
provoca a crise da esperança, pois rouba os sonhos, as aspirações, desorganiza
as lutas, abre espaços para messianismos políticos e religiosos ou para um
milenarismo alienante e vazio de sentido.
Esses
problemas atingem também os fiéis em suas necessidades subjetivas: sua busca de
Deus e sua noção de vinculação com a Igreja. Está na hora de valorizarmos a
religiosidade do povo e ampliarmos o diálogo ecumênico e inter-religioso.
(continua...)
Nenhum comentário:
Postar um comentário