(Lc 23,35-43) Uma estranha festa conclui o nosso ano litúrgico, e um
estranho evangelho parece contradizer esta festa. Um rei crucificado, isso é o
que celebramos hoje. A chave-de-leitura do evangelho de hoje está exatamente na
inquietante provocação da multidão a Jesus: “Se és o rei dos judeus, salva-te a
ti mesmo!” Esta provocação está também da boca dos sacerdotes e dos soldados
romanos. Todos estão de acordo com a idéia de que depender dos outros é um
sinal de fraqueza. Imaginam que uma pessoa poderosa é aquela que pode salvar-se
a si mesma, que pode pensar por si mesma, que tem meios para fazê-lo, sem
nenhuma necessidade dos outros. Deus seria aquilo que não podemos permitir-nos ser,
o mais poderoso dos poderosos, alguém que não tem necessidade de nada e de
ninguém. Para demonstrar que é verdadeiramente Deus, Jesus deveria
demonstrar-se egoísta, porque, no nosso estreito modo de pensar, Deus é o sumo
egoísta, alguém que basta a si mesmo, feliz na sua perfeita solidão. Deus seria
assim uma projeção dos nossos mais escondidos e inconfessáveis desejos, daquilo
que admiramos num político bem-sucedido, rico e seguro. É por isso que fazemos
tudo para seduzi-lo e corrompê-lo. Não, o nosso Deus não salva a si mesmo;
salva a nós, salva mim. Deus se auto-realiza doando-se, relacionando-se,
abrindo-se a mim, abrindo-se a nós. (Paolo Curtaz, Parola
& Preghiera, novembro/2013, p. 162)
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