Um soldado na contramão do exército
De
acordo com o jornalista Merval Pereira, o presidente Jair Bolsonaro parece um
soldado na contramão do exército. De fato, enquanto no mundo inteiro um
exército imenso de cientistas, médicos e profissionais de saúde em geral avança
corajosamente contra o inimigo invisível do Covid-19, o capitão marcha em
sentido inverso. Com razão dizem que foi um militar medíocre, tendo sido
expulso dos quartéis. É bem conhecida e notória a velocidade espantosa com que
o coronavírus se propaga, de forma inexorável e exponencial, aliada ao seu alto
grau de letalidade. Por isso é que a dura batalha no front exigeum conhecimento científico exaustivo, plural e
extremamente criterioso; e requer, por outra parte, um medicamento cirúrgico,
combinado e cirúrgico. O “doutor” Bolsonaro, porém, insiste em suas receitas
estapafúrdias de botequim, sem qualquer base científica comprovada.
Repetem-se
os desencontros entre a prática do governo brasileiro e a ciência. A narrativa
do negacionismo, além de distorcer o resultado das pesquisas científicas,
desinforma a população a respeito dos riscos a que ela se expõe. Pior ainda
quando a postura negacionista vem associada à prepotência e autoritarismo. A
soma de poder com ignorância resulta em tirania. Daí a urgente necessidade de
retomar o elo perdido (ou negado) entre o equilíbrio do ecossistema no planeta Terra,
por um lado, e o modelo político e econômico de exploração de seu potencial,
por outro. A história da humanidade no domínio da natureza, especialmente a
partir da tríplice revolução (mercantil, industrial e financeira) e suas
inovações tecnológicas, desfruta até a última grama de minério, os recursos do
meio ambiente (solo, subsolo e atmosfera). Além disso, desfruta ainda, também até
a última gota de suor, o trabalho humano. Dessa ação descontrolada, resulta a
contaminação das águas (mar, rios, lagos e lençóis freáticos)e do ar, bem como
o desmatamento florestal, o aquecimento global e o derretimento das geleiras.
Essa
exploração predatória que devasta os diversos biomas traz sobre a natureza um
resultado nefasto, nocivo e perverso. À medida que ela se agrava, proliferam as
estiagens prolongadas, inundações, furacões, ciclones, entre outras catástrofes
extremas – fatores que levam à fuga cada vez mais expressiva de refugiados
climáticos.Tudo se acelera ainda mais com a migração maciça e desordenada para
as cidades e metrópoles em todo o globo. Desde 2007, com efeito, a população
mundial passa a ser majoritariamente urbana. Nos países centrais, as cidades
chegam a abrigar mais de 80 a 90% dos habitantes. No Brasil medido pelo último
censo demográfico, essa porcentagem já ultrapassa a casa dos 80%. Por toda
parte, multiplicam-se as megalópoles com mais de 10 milhões de pessoas. Semelhante
quadro nos leva a retomar o elo estreito entre urbanização e pandemia. É o que
mostra o doutor e professor da UNIRIO, Eduardo Domingues, em um artigo sobre “A cidade que vai surgir depois da pandemia”.
Diz
o literalmente o referido texto: “o Relatório ‘Fronteiras 2016 sobre questões
emergentes de preocupação ambiental’, do Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente, apontou que cerca de 60% das doenças infecciosas em humanos são zoonoses
e que, em média, a cada quatro meses surge uma nova infecção em humanos. A
destruição contra o ambiente natural reduz os habitats de espécies isoladas e
as colocam em contato com humanos, propiciando novos tipos de infecções. O
aumento populacional de pessoas e de rebanhos animais confinados é outro fator
que proporciona condições favoráveis à disseminação do vírus. Sem falar da
globalização, da falta de saneamento e da precariedade das habitações, que
tendem ampliar essa propagação” (Cfr. Jornal O Globo, 15 de maio de 2020, Segundo Caderno, pág. 2).
No
combate ao coronavírus, em vez de negar a realidade ou professar a teoria da
conspiração, será mais útil ouvir o têm a dizer os estudiosos do assunto, em
vista da construção conjunta de políticas públicas e sanitárias sérias e
eficazes. Políticas que devem ser simultaneamente locais e globais, dada a
complexidade da economia globalizada.
Pe.
Alfredo J. Gonçalves, cs
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