Nenhuma lei, costume ou instituição está acima do direito a ter os meios
para viver | 368 | 02.06.24 | Mc 2,23-3,6
Há
pouco, Jesus havia curado um paralítico mediante a declaração de que ele não
era culpado de nada (cf. Mc 2,1-12) e partilhado uma refeição com pessoas
consideradas indignas (cf. Mc 2,13-18). Animados pela dignidade e liberdade que
Jesus, o esperado noivo da nova aliança, lhes conferia, os discípulos se
permitiram desconsiderar a lei do jejum. Tanto as ações de Jesus como as dos
seus discípulos irritaram profundamente o grupo dos fariseus, representantes do
legalismo sem coração.
Para completar o
escândalo, os discípulos de Jesus atravessam campos de trigo e recolhem os
grãos que necessitam para matar a fome, e isso no sacratíssimo dia de sábado.
Se levamos a sério a resposta de Jesus ao questionamento dos defensores da lei,
fazendo isso os discípulos afrontam duas leis: a lei que proíbe qualquer
trabalho no dia de sábado e a lei que impede a violação da propriedade privada.
É isso que transparece na referência de Jesus a Davi e seus companheiros, que,
estando com fome, se apropriaram das oferendas que pertenciam exclusivamente
aos sacerdotes.
O que Jesus quer
discutir e colocar em evidência, inclusive na cena seguinte, é o espírito e a
finalidade das leis e instituições. Para Jesus, o estômago febril de uma pessoa
faminta é mais sagrado que todos os templos, leis e instituições. Para salvar
uma pessoa ou um povo em situação de risco, o respeito à lei se torna
secundário. Faz parte da maturidade e da liberdade cristã desmascarar
corajosamente as leis, costumes e instituições que não fazem outra coisa que
oprimir os pobres.
Sabemos que no
Brasil, e não apenas aqui, a lei só é pesada e tem força quando se trata de
punir os pobres e quem participa das suas lutas. Jesus ensina que a lei não é
parâmetro absoluto para a justiça. A escravidão negra foi legal no Brasil; o
apartheid foi legal na África do Sul; a mutilação sexual das mulheres ainda é
legal em alguns países árabes; o congelamento dos investimentos na saúde e na
educação foram atos legais, assim como a desmantelamento dos direitos
trabalhistas...
É
claro que o Evangelho da liberdade é um tesouro que os cristãos e suas Igrejas
carregamos em vasos de barro, com o risco de quebrá-lo ou trancafiá-lo em
cofres invioláveis, longe da vida. Mas a luta para sermos libertária e
responsavelmente fiéis a esse Evangelho nos insta até a morte!
Meditação:
·
Você
consegue perceber como Jesus assume uma postura de relativização do templo, das
autoridades e de todas as instituições oficiais?
·
Por
que os cristãos perdemos ou menosprezamos a dimensão profética e libertária da
nossa fé, que relativiza instituições e autoridades?
·
Qual
poderia ser a reação dos cristãos de hoje diante de uma liderança religiosa que
respondesse como Jesus aos questionamentos oficiais?
·
Onde
ou em que você fundamenta ou legitima sua autoridade para criticar a ordem
social e anunciar que um outro mundo é possível?
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