Jesus erradica do nosso meio a exploração que contamina até a religião!
A experiência religiosa
está ligada a lugares, tempos, normas, símbolos e ritos que a expressam e
tornam palpável. Mas, por mais importantes e sedutores que sejam, eles são
apenas meios, e sofrem da ambiguidade de todas as realidades humanas e
históricas. Mesmo estando intimamente relacionados com a celebração da fé, podem
ser profundamente ambivalentes. E a caminha quaresmal ajuda-nos a purificar nosso
olhar, nosso pensar e nosso agir, inclusive em relação aos templos.
Jesus entra no templo durante
a festa da páscoa, que entulhada Jerusalém de peregrinos, fazia ferver o
comércio e o faturamento tanto ou mais que a fé. O povo chegava de todos os
lados para oferecer os sacrifícios, e para isso, precisava comprar os animais.
E os vendedores de animais e os cambistas estavam lá para facilitar os
‘negócios de Deus’ e faturar com a piedade popular. Como a lei proibia o uso de
moedas com imagens dos reis e dos impérios, lá estavam os cambistas como
operadores indispensáveis. As autoridades religiosas, usando a fé e o nome de
Deus, haviam transformado o templo em instrumento de exploração.
Entrando no templo e
vendo isso, Jesus fica simplesmente indignado. O zelo pelo bem-estar do povo o
inflama e consome. Por isso, expulsa os comerciantes, derruba as mesas dos
cambistas e pede aos vendedores de pombas que levem suas gaiolas embora. Sua
indignação é maior com estes últimos, pois são os exploram os mais pobres,
daqueles que só podiam comprar e oferecer pombas (cf. Lv 5,7; 14,30).
Ameaçando e expulsando
do templo os comerciantes e cambistas, Jesus denuncia o uso do nome de Deus
para fins de exploração e diz que, na prática, a elite religiosa e social que havia
se apropriado do templo e o administrava cultuava outros deuses. Como hoje,
quando muitas pessoas que invocam o nome de Deus para justificar sua
prosperidade e refutar as lutas dos pobres, excluem e violentam outros em nome
da própria honra. A ação de Jesus, mesmo parecendo um gesto violento, é uma
reação apaixonada em defesa das vítimas de uma violência exercida em nome da
religião e do mercado religioso.
A expulsão dos
comerciantes do templo é a primeira ação propriamente pública de Jesus relatada
no evangelho de João. Os dirigentes reagem imediatamente, solicitando as
credenciais de Jesus, perguntando com que direito ele faz isso. Eles pouco se
importam com a exploração dos possibilitada pelo templo sobre os pobres. Estão mais
interessados nas credencias de Jesus! Não querem apenas saber se Jesus se
apresenta como profeta, já que fazer um chicote e ‘botar ordem’ no templo era
um gesto ligado à chegada do Messias. Querem uma demonstração de que ele é
mesmo o Messias esperado.
Com sua desconcertante
ação simbólica, Jesus faz bem mais que purificar o templo ou corrigir o que se
praticava nele. Jesus declara que o templo não é mais caminho e espaço para o
encontro com Deus, que os sacrifícios e ritos são por si mesmos inúteis. A
partir de Jesus, Deus se deixa encontrar na humanidade das pessoas que amam e
lutam para superar a divisão e na comunidade que serve os mais necessitados. O
templo permanece unicamente como espaço de encontro e lugar para fazer memória
e cultivar a esperança. A verdadeira sacralidade deixa o templo e se hospeda
nos corpos dos filhos e filhas de Deus e nas ações concretas do corpo de
Cristo, que é a comunidade eclesial.
Ilustrando aquilo que
é visto como importante até hoje, Paulo escreve: “Os judeus pedem sinais e os
gregos procuram sabedoria”, ou seja: uns procuram e valorizam gestos
grandiosos, demonstrações de poder; outros confiam no conhecimento e no saber
bem organizado. Mas o poder e a sabedoria de Deus brilham em Jesus de Nazaré,
irmão servidor da humanidade, vítima da violência religiosa e política, que
veio derrubar os muros que separam e fazer unidade daquilo que está dividido.
Infelizmente até hoje temos Igrejas e movimentos que não fazem outra coisa
senão promover cultos e ‘milagres’ espetaculares e prometer prosperidade.
Senhor Jesus, para muita gente, teu ensinamento e tuas
atitudes parecem exageradas e inaceitáveis. Pensam que uma religião que
prioriza a fraternidade seja coisa destinada ao fracasso. Estão habituados a
decorar leis, frequentar cultos, impor doutrinas e ouvir condenações. Mas Paulo
diz que loucura de Deus é mais sábia que os homens, e que a fraqueza de Deus é
mais forte que os homens! Vem de novo, Jesus, e purifica as Igrejas do entulho
moralista, escapista, dinheirista e autoritário. Que nossas comunidades sejam
teu corpo, constituído de membros igualmente dignos e solidários, continuadores
da tua compaixão. Amém! Assim seja!
Itacir Brassiani msf
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