A fé em Jesus Cristo é o alicerce que sustenta a Igreja.
Jesus deixa a região marginal da Galileia, onde
revelou sua compaixão pela multidão faminta e tomou a iniciativa de
alimentá-la, e chega à região de Cesaréia de Filipe. No passado, esta região
fora famosa pelo santuário dedicado a Pã, divindade protetora dos rebanhos e
pastores. Mais tarde, o rei Filipe rebatizara a cidade com o nome de Cesaréia,
em homenagem a César Augusto. Este nome e esta homenagem de um rei capacho dos
dominadores mexiam com a questão da soberania e da submissão política de um
povo.
A primeira pergunta que Jesus dirige aos discípulos,
justamente neste lugar carregado de significado político, soa como uma espécie
de enquete: “Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?” Lembremos que a
expressão ‘Filho do homem’, com a qual Jesus se refere a si mesmo, destaca os
vínculos de Jesus com humanidade, e é o título que ele prefere e usa com mais
frequência. Conhecedor da ambiguidade dos conceitos e expectativas que
escondem, Jesus evita referir-se a si mesmo como Filho de Deus ou Messias...
Podemos imaginar que a resposta não tenha saído assim
muito rapidamente. Entre os discípulos fez-se silêncio, e eles se esforçaram
para recordar aquilo que o povo dizia depois de ter escutado e conhecido Jesus.
As respostas que eles resumem vinculam Jesus claramente ao movimento profético.
O povo identifica a ação e a pregação de Jesus com a missão dos grandes
profetas da sua tradição, aqueles homens e mulheres que falavam e agiam em nome
de Deus e defendiam os direitos dos sem-direitos.
Mas parece que o interesse de Jesus não é apenas fazer
uma espécie de pesquisa de opinião. Ele escuta atentamente a resposta dos
discípulos, mas não comenta a síntese que eles apresentam. Faz-se novamente
silêncio. Então Jesus, olhando os discípulos nos olhos, pergunta-lhes
enfaticamente: “E vocês,
quem dizem que eu sou?” O que interessa a Jesus são as ideias, fantasias e
expectativas que povoam a mente e o coração dos homens e mulheres que seguem
seus passos e escutam suas palavras.
A pergunta é séria, e as respostas não estão escritas
em nenhuma cartilha. A tradição na qual os discípulos haviam sido formados
oferecia possibilidades diversas e contrastantes de resposta. O chão que eles
pisam lembra deuses pastores e impérios dominadores. A pergunta toca direto nas
expectativas que eles alimentam sobre Jesus, e coloca em questão a relação que
tem com ele. No fundo, Jesus pergunta “que lugar eu ocupo na vida, no projeto e
nas opções de vocês?”
Tanto para aqueles discípulos com para nós, as
respostas que ouvimos dos nossos pais, catequistas, padres e professores podem
ajudar, mas são radicalmente insuficientes. A resposta à pergunta de Jesus deve
vir da vida pessoal e eclesial; está inscrita nas nossas práticas,
relacionamentos, opções e utopias; está oculta no tipo de relação que
cultivamos com Jesus de Nazaré, no lugar que ele ocupa na nossa existência.
Portanto, não pode ser uma resposta à flor da pele, na ponta da língua, aprendida
e decorada, irrefletida.
Pedro rompe o silêncio. Com voz insegura, mas sereno e
até ousado, fala, como sempre, em nome de todos: “Tu és o Messias, o Filho do
Deus vivo.” É uma afirmação de fé, que reconhece que aquele ser humano concreto
que se compadece da multidão faminta e elogia a fé de uma mulher pagã, é o
Ungido pelo Espírito Santo, o enviado de Deus para realizar seu projeto. E
Jesus chama Pedro de rocha, pois é sobre essa adesão de fé que ele confia a
continuidade da sua missão. Esta adesão se torna chave que abre e fecha portas.
A resposta de Pedro não nasce dos medos ou desejos
infantis de onipotência, nem é ensinada pelos doutores de plantão. O
reconhecimento e a fé num Deus presente na carne humana é dom de Deus aos
pequenos. Não precisamos da graça para aderir a um deus que se identifica com
os poderosos e as grandes obras, mas ela é indispensável para reconhecer Deus
na história. É nisso que se manifesta a profundidade da riqueza, da sabedoria e
da ciência de Deus, como diz o apóstolo Paulo.
Deus pai e mãe! Teus caminhos são impenetráveis, tu andas pela
contramão da história dos grandes e potentes. Oxalá nossa pregação não se apoie
no poder do dinheiro, na força das armas, na persuasão da oratória ou na
violência de quem não se conforma com as mudanças. E que tua Igreja, inspirada
na prática de Jesus de Nazaré, o missionário querido que enviaste ao
mundo, valorize e promova a vocação dos leigos e leigas, tanto na
sociedade como na Igreja, reconhecendo-os como perfume de Cristo, fermento do
Reino e glória do Evangelho, como ensinam os Bispos do Brasil. Assim seja!
Amém!
Itacir Brassiani msf
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