sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Preparando o Natal

Felizes os insatisfeitos!

Pertenço ao grupo de homens e mulheres insatisfeitos. Penso que as coisas não estão como deveriam estar. Não aceito que o atual mundo transformado em paraíso tecnológico e comercial seja o melhor dos mundos possíveis. Sonho um outro mundo, no qual caibam todas as pessoas. Partilho, discuto e prego esse sonho de mudança. Por isso mesmo, sou um homem feliz. Insatisfeito e feliz. O Mestre cuja escola frequento ensina: “Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados” (Mt 5,6).

Faz parte do meu compromisso com os sonhos a denúncia e o desmascaramento dos discursos que encobrem e disfarçam a maldade das estruturas e projetos, mas há pessoas que ficam aterrorizadas com reflexões que rompem os limites da ideologia estabelecida. Por trás deste medo está o compromisso ingênuo ou interesseiro com a manutenção de um mundo desigual, excludente e violento. Qualquer palavra ou ação que aponte para mudanças é logo taxada de ideológica ou inconsequente.

Para aqueles que se colocam no caminho de Jesus Cristo e aderem ao seu projeto, o desejo de mudança não deveria ser coisa estranha ou temida. Sua vida foi um esforço permanente para dar um novo sentido aos velhos conceitos do judaísmo e um novo dinamismo aos sonhos de emancipação do seu povo. Ele pagou com a própria vida a ousadia de sonhar e propor uma nova ordem, pois dizia que não veio costurar remendos nas velhas estruturas, que seu vinho novo pedia novos barris.

É lamentável que muitos cristãos ainda fiquem irritados quando ouvem os padres ou pastores pregando a necessidade de justiça e fraternidade no país e no mundo, ou refletindo sobre a necessidade de cuidar da Casa Comum. Um pouquinho de capacidade crítica e outro tanto de conhecimento bíblico ajudaria muito. Talvez falte mais abertura e conversão que conhecimento, pois não podemos ver as coisas dando-lhes as costas. A Jesus nós seguimos mais para aprender a ver e a conviver que salvar a alma.

A peregrinação espiritual do Advento, no espírito do Ano Jubilar, está cheia de apelos a não ter medo, a sonhar como novos céus e nova terra. No próximo domingo, o profeta Sofonias pede: “Não temas, não te deixes levar pelo desânimo. O Senhor está no meio de ti” (3,16-17). E João Batista, questionado sobre o que fazer para acolher o Salvador, responde: “Quem tem duas túnicas, dê uma para quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo” (Mt 3,11). A Paz pela qual anelamos é irmã gêmea da Justiça!

No quarto domingo do Advento, o profeta Miquéias, homem insatisfeito e visionário, anuncia que Belém não está destinada à insignificância, e que os pobres não estão destinados a mastigar a própria pobreza. Está vindo um líder que não recuará diante dos poderosos, não governará de costas para os humildes e não descansará enquanto não promover a paz (cf. Mq 5,1-4). E, dos lábios femininos de Isabel, aprendemos que são felizes e bem-aventurados aqueles que acreditam, pois Deus cumpre o que promete (cf. Lc 1,45). Sim, os insatisfeitos, aqueles que têm sede de justiça, serão saciados.

Dom Itacir Brassiani msf

Bispo de Santa Cruz do Sul

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