sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

4° Domingo do Advento


Deus sempre olha para a humilhação dos seus filhos e filhas!
(Miq 5,1-4; Sl 78/80; Hb 10,5-10; Lc 1,39-46)
Neste quarto domingo da caminhada do Advento nossa atenção é atraída pelo encontro entre duas mulheres grávidas. As margens do rio no qual João Batista ensinava e batizava dão lugar a um ambiente familar e o apelo forte e claro de João Batista dà vez à voz da alegria feminina. Somos convidados/as a celebrar a grandeza dos pequenos, a dignidade do corpo e a alegria de crer. Continuamos guiados/as pela esperança, pois é somente nela que somos livres e alcançamos a salvação, mas já podemos tocar com a mão aquilo que esperamos. Inspirados no cântico de Maria, podemos dizer que Deus continua olhando para a humilhação do seu povo, e quem experimenta isso vive uma alegria inexplicável e indestrutível. Quando mulheres idosas se tornam mães, quando desertos viram jardins, quando mortos ressuscitam e virgens engravidam, nada mais é impossível e a esperança vira semente, certeza e festa. Todas as gerações reconhecem que é feliz quem ousa acreditar.
“Tu Belém, pequenina entre as adeias de Judá...”
A grandeza sempre atrai e seduz. Seu poder e seu brilho costumam enfeitiçar nossos sentidos. Fugimos da pequenez e do anonimato, pois eles parecem negar e roubar nossa dignidade. Às vezes, sentimo-nos constrangidos/as quando nos perguntam de onde somos. Como dizer que somos de Anchieta, de São Gabriel, de Carauari ou de Bom Jesus do Oeste? Quem dará importância a lugares insignificantes como estes? Gostaríamos de responder que somos do Rio de Janeiro, de Porto Alegre ou de Florianópolis...
Quem de nós sabia da existência de Xapuri (AC) antes do martírio do profeta Chico Mendes, no dia 22 de dezembro de 1988? E quem sabia algo sobre Anapú (PA), até que Dorothy Stang teve seu sangue derramado pela violência dos latifundiários em fevereiro de 2004? E quem saberia de Nazaré se não fosse a feminina prontidão de Maria para se colocar a serviço do projeto de Deus? Gente simples, em lugares desconhecidos, fazendo pequenas coisas provoca grandes mudanças...
O próprio Deus gosta de andar pela contra-mão e de celebrar as pessoas humildes e os pequenos lugares. Ele prefere os endereços remotos e insignificantes. Eis o que Ele anuncia pela boca do profeta Miquéias: “Mas você, Belém de Éfrata, tão pequena entre as principais cidades de Judá. É de você que sairá para mim aquele que há de ser o chefe de Israel.” É nos lugares pequenos e insignificantes que a paz costuma ser gerada e conservada e que o povo estabelece vínculos e laços de entre-ajuda.
“Mas formaste um corpo para mim...”
Mas eu gostaria de repetir: a grandeza e o poder exercem grande atração sobre nós. Quem ainda não se flagrou desejando realizar grandes coisas, escrever textos admiráveis, fazer ofertas notáveis, desenvolver homilias memoráveis? De novo, as coisas de Deus conhecem outros caminhos. A carta aos Hebreus acena para este mistério quando diz que, ao vir ao mundo, o Filho de Deus disse: “Tu não quiseste sacrifício e oferta. Em vez disso, tu me deste um corpo. Holocaustos e sacrifícios não são do teu agrado. Por isso, eu disse: Eis-me aqui, ó Deus, para fazer tua vontade.”
Sacrifícios e ofertas não são o ponto fraco de Deus. Ele prefere dar-nos um corpo para que nele e com ele realizemos sua vontade. Grandes idéias, projetos fabulosos, ideais inflados, sentimentos profundos e construções majestodas representam pouco diante da beleza e das possibilidades que nos são dadas com o corpo. O que Deus deseja mesmo é que sua Palavra se faça carne em nossas mil relações cotidianas. O presente mais precioso que podemos dar a Deus no Natal do seu Filho é fazer ecoar a voz de uma multidão de homens e mulheres anônimos: “Eis-me aqui para fazer tua vontade!”
Eis o que representam Isabel e Maria: dois corpos que se dispõem a acolher o Mistério, duas liberdades prontas a fazer a vontade de Deus, duas mulheres insignificantes e de lugares desconhecidos que fazem a diferença. No abraço afetuoso, no grito melodioso e na dança ritmada daqueles corpos abraçados por Deus, até as pequenas criaturas que elas carregam no ventre se emocionam e participam. Há algo mais belo que mostrar ao mundo, mediante nosso próprio corpo, a certeza de que algo novo começou e que a esperança se tornou realidade?
“Como posso merecer que a mãe do meu Senhor venha me visitar?”
O encontro entre Maria e Isabel que estamos contemplando é uma espécie de ampliação do anúncio do anjo a Maria e do confirmação do sinal por ele oferecido. O que é mesmo que vem confirmado? Que Deus olha para a humilhação dos seus filhos e filhas e os escolhe como seus protagonistas; que a humanidade e a liberdade germinam em lugares e pessoas consideradas insignificantes; que para Deus nada é impossível; que a felicidade brota da despojada ousadia de acreditar.
Isabel é uma mulher sábia e fiel. Acolhe Maria e é capaz de ver nela a realização da mais grandiosa promessa de Deus. Reconhece nela a felicidade própria das pessoas que ousam acreditar. Celebra em Maria uma espécie de Arca viva da Aliança de Deus com seu povo. A pergunta de Isabel traduz seu alegre espanto e é uma citação indireta das palavras de Davi ao receber a arca com o documento da Aliança: “Como é que a arca de Javé poderá ser introduzida na minha casa?” (2Sm 6,9).
A cena está cheia de alegria feminina. Em momentos grandes como este as palavras parecem sobrar. Quando tocamos com a mão os pequenos sinais de algo grandioso que começa a acontecer, nossos lábios se abrem em profecia: ‘Felizes são as pessoas que ousam acreditar! Felizes aqueles/as que sonham, pois correm o risco de ver sua realização! Bem-aventurados/as aqueles/as que ensaiam em seus corpos as novas relações que reinvindicam! Bendito seja quem reconhece a pessoa humana como Arca de Deus! Bendito seja Deus que derruba os poderosos e eleva os humildes!’
 “A criança pulou de alegria no meu ventre...”
A alegria das mães contagia os filhos que elas carregam no ventre. Também eles vibram com a nova aliança de Deus com a humanidade. Eles são sinais e frutos desta aliança que tem o sabor da humanidade de Deus e força de eternidade. João Batista participa da alegria de Isabel e saúda aquele que é mais frágil mas se tornará mais forte que ele. E Isabel sente claramente: “Logo que a sua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança saltou de alegria no meu ventre.”
Que este estremecimento de alegria chegue até nós. Deixemo-nos enternecer pelo Onipotente que se abriga pobremente em nossa limitada carne. Abramos nossas portas, tão hermeticamente fechadas por causa do medo, para acolher as pessoas que portam sinais e boas notícias. Exultemos de alegria diante de um Deus que vem pela contra-mão, que escolhe lugares esquecidos e pessoas despretensiosas para fazer grandes coisas. E que todos/as possam participar da nossa alegria!
Mas não esqueçamos que continuamos vivendo num velho mundo, onde muitas pessoas continuam amargando a humilhação e onde os lobos continuam perseguindo os cordeiros. Façamos pois coro com a multidão de homens e mulheres de boa vontade que suspiram e clamam: “Senhor, vem visitar tua vinha, a muda que tuas mãos plantaram com carinho. Desperta teu poder e vem socorrer-nos. Faze brilhar tua face e seremos salvos.” Seja esta nossa prece incessante nesta ante-vigília do santo Natal.
“Eis que eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade.”
Neste momento, holocaustos, sacrifícios e grandes presentes pouco interessam. Ofereçamos nosso corpo, nossa palavra e nossa vontade a fim de que Deus possa se fazer presente no mundo. Como Maria e Isabel, celebremos a felicidade de quem acredita e não teme o futuro das crianças que carregam no ventre. E não esqueçamos de, em nome do Menino Jesus que está perto, empenhar também nossa palavra e nosso nome na defesa dos direitos das crianças e dos/as adolescentes.
Como esquecer que, além das crianças assassinadas em Newtown existem milhões de crianças submetidas ao martírio da fome e são mais de 2 milhões as crianças infectadas pelo vírus da AIDS? E que são mais de 15 milhões as crianças e adolescentes com menos de 18 anos que perderam os pais por causa da AIDS? Não podemos nos omitir da luta pelo acesso universal ao tratamento desta enfermidade. Em nome dos meninos Jesus e João Batista: é uma questão de humanidade!
Deus, alicerce da nossa paz e fonte da nossa alegria: na bruma leve das paixões que vêm de dentro já vemos os sinais da proximidade do teu filho amado. Vem em nosso auxílio para que ele não nos surpreenda preocupados apenas com comidas, presentes e férias. Que resplandeça em nosso corpo a alegria de quem vive com sede e fome de justiça e de beleza, presentes preciosos que nos dás no Santo Menino que quer estender sua esteira no meio de nós. Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf

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