A ONU incluiu o direito à
alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta
por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves
textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São
informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente
livro Destruction massive. Géopolitique de la
faim, de Jean
Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora
Seuil (Paris).
Agrocombustíveis: solução mentirosa e
catastrófica.
A degradação climática é um fato de dimensões planetárias.
A desertificação e a degradação do solo afetam mais de 1 bilhão de pessoas em
100 países. As regiões de terras secas representam mais de 44% das terras
agricultáveis do planeta. Esta degradação é mais grave na África, onde milhões
de pessoas dependem diretamente da terra para sobreviver. Nesse continente, 1/3
da população vive em terras áridas ou secas. Atualmente, 500 milhões de
hectares de terras cultiváveis africanas estão degradadas.
“Em todo o mundo, os desertos estão avançando. Na
China e na Mongólia, às margens do deserto de Gobi, a cada ano novas áreas de
pastagens e de agricultura de sobrevivência são engolidas pelas montanhas de areia
que avançam terra adentro. Em cetas regiões do Sahel, o deserto do Sahara
avança 5 km por ano” (p. 253).
“A destruição dos ecossistemas e a degradação de
vastas áreas agrícolas no mundo inteiro, mas sobretudo na África, representam uma tragédia para os pequenos
agricultores e criadores. A ONU estima que no continente negro existam em torno
de 25 milhões de ‘refugiados ecológicos’ ou ‘migrantes ambientais’, ou seja:
seres humanos obrigados a abandonar seus lares por causa de catástrofes
naturais (inundações, desertificação) e que acabam tendo que se bater pela
sobrevivência nas periferias das grandes metrópoles” (p. 254).
Os trustes agroalimentares que dominam a fabricação e
o comércio dos biocombustíveis apresentam um argumento aparentemente irrefutável:
a substituição da energia de origem fóssil por sua irmã de origem vegetal seria
uma arma invencível contra a rápida degradação do clima e os danos
irreversíveis que ele provoca sobre o meio ambiente e os seres humanos. Eles
conseguiram vender essa idéia à maioria da opinião pública mundial e à quase
totalidade dos Estados ocidentais.
Existem dois tipos principais de biocombustíveis: a linha do bioetanol
(ou alcool) e a linha do biodiesel. O
‘bio’ que entra na composição desses neologismos indica que tais combustíveis
são produzidos a partir de matéria orgânica (ou biomassa). Mas isso não tem nada a ver com o ‘bio’ daquelo que
conhecemos como agricultura biológica...
Nos últimos anos, os biocombustíveis, propagandeados
como ‘ouro verde’, vêm se impondo como
um complemento mágico e rentável ao ‘ouro negro’. Entre os anos 2006 e 2011 a
produção mundial de agrocombustíveis simplesmente duplicou. Em 2011 foram
produzidos mais de 100 bilhões de litros de bioetanol e de biodiesel. Para
tornar possível esta produção foram usados 100 milhões de hectares de de terra.
Os argumentos das empresas de agrocombustíveis são,
para dizer o mínimo, mentirosos. A
produção de agrocombustíveis tem um alto
custo ambiental, pois necessita de muita terra, água e energia. São necessários 4.000 litros de água para
fabricar 1 litro de bioetanol. “Do ponto de vista da reserva de água do
planeta, a produção anual de bilhões de litros de agrocombustíveis constitui
uma verdadeira catástrofe” (p. 256).
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