quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Reforma radical e urgente do sistema financeiro internacional


Por um sistema financeiro a serviço de todos os povos


Frente à crise econômica e financeira global deflagrada em 2008 e à ‘rapina’ dos confres estatais para soccorer as instituições de crédito, com o consequente corte nos investimentos no bem-estar social dos cidadãos, a Igreja Católica, através do Pontifício Conselho Justiça e Paz (PCJP) propõe uma urgente e profunda reforma do sistema financeiro e monetário internacional (cf. Por uma reforma do sistema financeiro e monetário internacional na perspectiva de uma autoridade pública de competência universal, 2011).

Segundo o referido Conselho, três fatores contribuíram para a gravidade da atual crise: os organismos surgidos no consenso da década de 1970, como o FMI, não respondem mais à necessidade de dar estabilidade ao sistema monetário mundial; o rápido processo de globalização sem (e contra) um corpo mínimo de regras de orientação e controle compartilhadas; o aumento irracional de emissão de moeda (dólar americano) sem o correspondente crescimento de bens e serviços.

Os próprios líderes do G20 afirmaram, em 2009, que “a crise econômica confirma a importância de iniciar uma nova era na economia global, fundada sobre a responsabilidade” (porque a crise atual nasce de uma economia sem responsabilidade!). Para tanto, além das medidas urgentes e de caráter técnico, faz-se necessária uma “reforma da arquitetura global para enfrentar as exigências do século XXI”. Ou seja: um quadro no qual seja possível “definir as políticas e medidas comuns para gerar um desenvolvimento global sólido, sustentável e equilibrado”.

Nesta linha, o PCJP pede uma atenção especial à reforma do sistema monetário internacional, especialmente às formas de controle monetário global. Isso significa colocar em discussão os sistemas de trocas existentes e buscar novos mecanismos de coordenação e supervisão, envolvendo também as chamadas ‘economias emergentes’ e todos os demais países. Um caminho concreto e importante é algo como um banco central mundial, cuja tarefa seria regular o fluxo e o sistema de câmbio monetário, inclusive descartando o dólar como referência internacional e criando um referencial monetário realmente imparcial. É claro que esse passo pressupõe outros, como uma autoridade pública com competência universal, cuja tarefa é garantir a realização da bem comum e a efetiva fraternidade global.

Naquilo que está ao alcance das comunidades cristãs e das instituições católicas no momento, dentro de uma perspectiva essencialmente ética, podemos começar refletindo e debatendo algumas questões de fundo. Uma primeira pode ser o estabelcimento de uma taxa sobre as transações financeiras internmacionais, cujo resultado seria aplicado no desenvolvimento global sustentável e na constituição de um fundo para sustentar a economia dos países mais golpeados pelas crises.

Uma segunda questão a debater é a definição de critérios para o socorro estatal às instituições de crédito privadas, como, por exemplo, a exigência de um comportamento virtuoso e voltado à economia real da sociedade. Outra questão, mais complexa mas igualmente urgente, é discutir e definir com mais clareza o âmbito das atividades de crédito ordinário e o das atividades de investimento bancário, disciplinando os ‘mercados-sombra’, que atualmente estão sem qualquer tipo de controle e de limites.

No documento em questão, o Pontifício Conselho Justiça e Paz sublinha que é tarefa da geração atual reconhecer e aceitar conscientemente o dinamismo histórico que reivindica a realização de um bem comum mundial. Isso significa empenhar-se na transição de uma época arcaica de competição e luta entre as nações a uma fase de sociedade internacional mais coesa, policêntrica, respeitosa da identidade de cada povo que, a seu modo, contribui para a richeza da única humanidade. E isso sem medo da exigência de transferir de modo gradual, proporcional e equilibrado à autoridade pública mundial algumas atribuições que hoje são das autoridades nacionais.

O PCJP sublinha que não devemos ter medo de propor coisas novas, mesmo se estas possam desestabilizar o atual equilíbrio de forças, que privilegia minorias ricas e marginaliza multidões. “A concepção de uma nova sociedade, a construção de novas instituições com vocação e competência universais, são uma prerrogativa e um dever de todos, sem nenhuma espécie de distinção. O que está em jogo é nada mais e nada menos que o bem comum da humanidade e o próprio futuro” (p. 39).

Itacir Brassiani msf

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